ISSN: 2526-849X



Dificuldades e desafios dos professores do ensino fundamental 1 em relação ao ensino de ciências


Difficulties and challenges of fundamental education teachers 1 in relation to science education


Dificultades y desafíos de los profesores de primaria 1 en relación a la enseñanza de las ciências


Sidélia Ribeiro Neto Preciozo1

Fernanda Welter Adams2

Simara Maria Tavares Nunes3


Resumo


O ensino de Ciências é de suma importância para a formação cidadã, pois desde que seja planejado pode possibilitar uma compreensão do mundo, ou seja, promover uma leitura do mundo. Entretanto são vários os desafios para que a formação cidadã ocorra e um deles é a formação inicial dos professores no ensino de Ciências. Vários autores têm discutido as dificuldades dos professores do Ensino Fundamental 1 com relação a essa área de conhecimento. Assim, o presente artigo tem como objetivo apresentar um recorte de um Trabalho de Conclusão de Curso no qual abordamos as dificuldades e os desafios enfrentados pelos docentes do Ensino Fundamental 1 no exercício de sua ação pedagógica no ensino de Ciências em uma escola da rede pública do interior do estado de Goiás. Para o desenvolvimento da pesquisa utilizamos para coleta de dados questionários com perguntas abertas e fechadas, que foram respondidos por oito professores das turmas do 1º ao 5º ano da escola. Os dados obtidos por meio dos questionários foram transcritos e analisados de acordo com a Análise Textual Discursiva. Avaliamos que os professores reconhecem a importância do ensino de Ciências para a formação dos alunos, porém apontam uma série de dificuldades, como falta de tempo devido à cobrança sobre Português e Matemática, de recursos didáticos e, por fim, de formação inicial adequada. Acreditamos que a oferta de uma formação continuada poderia auxiliar a mudar a realidade do ensino de Ciências no Ensino Fundamental 1.

Palavras-chave: Ciências da natureza; Dificuldades; Formação docente.


Abstract

Science teaching is of paramount importance in citizen education; as long as it is planned, it can enable an understanding of the world, that is, it promotes a reading of the world. However, there are several challenges for citizen training to occur and one of the challenges is the initial training of teachers in Science Education. Several authors have discussed the difficulties of Elementary School teachers in this area of ​​knowledge. Thus, this article aims to present an excerpt from a Course Conclusion Paper in which we approach the difficulties and challenges faced by teachers of Elementary School 1 in the exercise of their pedagogical action in Science Teaching in a public school in the countryside from the state of Goiás. For the development of this research, questionnaires with open and closed questions were used to collect data, which were answered by eight teachers from classes from the 1st to the 5th year of the School. The data obtained through the questionnaires were transcribed and analyzed according to the Discursive Textual Analysis. It is assessed that teacher recognize the importance of Science Education for the training of students. However, they point out a series of difficulties such as lack of time due to the charge on Portuguese and Mathematics, the lack of didactic resources and, finally, the lack of adequate initial training. It is believed that the provision of continuing education could help to change the reality of Science Education in Elementary Education 1.

Keywords: Natural sciences; difficulties; teacher traini


Resumen


Enseñanza de las Ciencias es de suma importancia en la formación ciudadana; siempre que sea planificada, puede posibilitar una comprensión del mundo, es decir, promueve una lectura del mundo. Sin embargo, existen varios desafíos para que se dé la formación ciudadana y uno de los desafíos es la formación inicial de los docentes en Enseñanza de las Ciencias. Varios autores han discutido las dificultades que enfrentan los docentes de la escuela primaria 1 en esta área del conocimiento. Así, este artículo tiene como objetivo presentar un recorte de un Trabajo de Conclusión de Curso en el que abordamos las dificultades y desafíos que enfrentan los docentes de la Enseñanza Básica 1 en el ejercicio de su acción pedagógica en la Enseñanza de las Ciencias en una escuela pública del interior del estado de Goiás Para el desarrollo de esta investigación, se utilizaron cuestionarios con preguntas abiertas y cerradas para la recolección de datos, que fueron respondidos por ocho profesores de las clases de 1° a 5° grado de la Escuela. Los datos obtenidos a través de los cuestionarios fueron transcritos y analizados según el Análisis Textual Discursivo. Se evalúa que los docentes reconocen la importancia de la Enseñanza de las Ciencias para la formación de los estudiantes. Sin embargo, señalan una serie de dificultades como la falta de tiempo por las exigencias de portugués y matemáticas, la falta de recursos didácticos y, por último, la falta de una formación inicial adecuada. Se cree que la oferta de educación continua podría ayudar a cambiar la realidad de la Enseñanza de las Ciencias en la Enseñanza Básica 1.

Palabras clave - Enseñanza de las ciencias; Desafíos; Formación de profesores.



Introdução

O ensino de Ciências é primordial para o processo de ensino e aprendizagem, pois permite ao aluno a compreensão das transformações da natureza e do mundo em que vive. De acordo com Lopes e Dulac (2007): “a aprendizagem dos conteúdos de Ciências pode inserir o aluno em um mundo de significados novos.” Nesse sentido, caberia ao professor estimular, motivar os seus alunos para a aprendizagem. Segundo os autores, esse trabalho pode ser feito por meio de experimentos e pesquisas, ou seja, é preciso levar os alunos para o laboratório de Ciências, realizar pesquisas com diferentes recursos didáticos, etc. (LOPES; DULAC, 2007).

Então, “ensinar ciências no mundo atual deve constituir uma das prioridades para todas as escolas, que devem investir na edificação de uma população consciente e crítica diante das escolhas e decisões a serem tomadas” (BIZZO, 2007, p. 16). Principalmente um ensino que leve em consideração a Ciência como uma construção humana, fornecendo informações que possibilitem a leitura, a melhor compreensão e o entendimento do mundo (PIRES, 2017).

Ainda com relação à importância de ensinar Ciências, Pinto, Jung e Silva (2020) destacam que a valorização desse ensino requer a formação de um senso crítico necessário para o desenvolvimento da cidadania. Além disso, o estudo sobre a natureza, as relações entre os seres vivos e a ecologia social pode contribuir para o desenvolvimento da ética, da justiça, do respeito mútuo, da solidariedade, da tolerância, do reconhecimento da diversidade, da preservação do ambiente em articulação com a saúde e com a vida, o que é essencial para haver democracia.

Entretanto é perceptível que da mesma forma que o ensino de Ciências é primordial no processo formativo dos alunos da Educação Básica, ele tem sido um dos desafios para os professores, sobretudo para aqueles dos anos iniciais do Ensino Fundamental, formados na maioria das vezes em Pedagogia. Os professores nem sempre conseguem estimular, motivar e incentivar o aluno e utilizar recursos e ferramentas pedagógicas nesta área de ensino; ou seja, o professor das séries iniciais não se sente preparado para lançar mão de metodologias na área de ensino de Ciências. Segundo Santana Filho, Santana e Campos (2011), a importância do ensino de Ciências da Natureza é reconhecida por pesquisadores da área em todo o mundo, havendo uma concordância relativa quanto à inclusão de temas relacionados à Ciência e à Tecnologia nas séries iniciais (1º ao 5º ano). Porém os autores frisam que apesar desta convergência existente, principalmente nas propostas curriculares e nos planejamentos escolares, a criança sai da escola com conhecimentos científicos insuficientes para compreender o mundo que a cerca (SANTANA FILHO, SANTANA e CAMPOS, 2011).

Pesquisas evidenciam que os conteúdos de Ciências têm sido trabalhados de forma desconexa. Autores como Auler (2007), Lopes e Dulac (2007), Lorenzetti (2000), Santos (2007), Chassot (2003), entre outros, apontam que tradicionalmente os conteúdos atrelados às Ciências da Natureza são abordados pontualmente e de forma desconexa com a vida do aluno na sociedade. É evidente que estes professores não se sentem preparados para atuarem na área de Ciências da Natureza no Ensino Fundamental 1, ou seja, há uma carência no processo de formação inicial que se estende na formação continuada.

Para Ducatti-Silva (2005), é do conhecimento de todos que os professores terminam o antigo magistério ou uma licenciatura em Pedagogia sem obterem os conhecimentos necessários para o ensino de Ciências, tanto em termos de conteúdos quanto de formação pedagógica. Isso vem contribuindo sobremaneira para que o ensino científico não encontre o seu lugar na escola das séries iniciais. Como um professor vai trabalhar conteúdos científicos se não possui domínio, ficando restrito apenas ao que os livros didáticos trazem como informação?

Segundo Bonando (1994), o ensino de Ciências da Natureza, de certa forma, tem acontecido de maneira que os conteúdos são apresentados muito superficialmente por meio de aulas expositivas e cópias nos cadernos, de perguntas e respostas. Nesse contexto, acaba divergindo do que propõe Hamburger (2007): “O desafio do educador é promover condições para que atue com sucesso.” Essa afirmação indica que a construção de conhecimentos começa durante a formação acadêmica, quando o professor desenvolve o hábito de refletir sobre a própria formação, não só aquela adquirida em sala de aula, mas aquela aprendida em suas pesquisas, leituras, discussões e participações em eventos. Nesse momento, o professor está formando seu repertório de conhecimentos que carregará ao longo de sua vida, com a necessidade de aprimoramento constante.

Assim, este trabalho tem como objetivo apresentar as dificuldades e os desafios apontados pelos professores de uma escola pública municipal no que se refere ao ensino de Ciências.


Metodologia


A finalidade desta pesquisa foi compreender como se desenvolve o ensino de Ciências da Natureza nas séries iniciais (1º ao 5ºano) do Ensino Fundamental de uma escola pública de Catalão - GO. Neste estudo, nossas ações nos levam a uma aproximação com a realidade, de maneira consistente e consequente. Assim, para o desenvolvimento da pesquisa, os professores de 1º ao 5º ano da Escola participante foram contatados a fim de investigarmos concepções e práticas sobre o ensino de Ciências, como metodologias, procedimentos e recursos pedagógicos em Ciências que promovam a desejada formação crítica dos alunos.

Participaram da pesquisa oito professores efetivos da rede municipal de educação, sendo: três do gênero masculino (37,5%) e cinco do gênero feminino (62,5%).

Os dados foram obtidos por meio de questionários que foram analisados segundo a Análise Textual Discursiva. Concordamos com Gatti (2005) quando ela afirma que pesquisar:

[...] é avançar fronteiras, é transformar conhecimentos e não fabricar análises segundo determinados formatos. A autora enfatiza que só existe pesquisa quando o pesquisador estiver consciente e atento aos modos específicos de se situar a pesquisa, ou seja, ter clareza e domínio metodológico (GATTI, 2005, p.57).


Nossa preocupação não foi com aspectos da realidade educacional que podem ser quantificados, mas sim buscamos centrar nossa atenção e compreensão na dinâmica das relações sociais. Trata-se, portanto, de uma pesquisa de caráter qualitativo, que tem sua gênese nos questionamentos sobre a atual realidade do ensino de Ciências Naturais no Ensino Fundamental 1, sondando se esse tem sido trabalhado/ministrado de forma a atender aos alunos e a dinamizar o processo de ensino aprendizagem, propiciando uma formação para a cidadania e a autonomia, valorizando a participação da criança na busca do conhecimento.

Martins (2008) afirma que a pesquisa qualitativa é um método de investigação científica que se foca no caráter subjetivo do objeto analisado, estudando as suas particularidades e experiências individuais, por exemplo.

Em uma pesquisa qualitativa as respostas não são objetivas e o propósito não é contabilizar quantidades como resultado, mas sim conseguir compreender o comportamento de determinado grupo-alvo. Normalmente as pesquisas qualitativas são realizadas com um número pequeno de entrevistados. A escolha pela pesquisa qualitativa como metodologia de investigação ocorre quando o objetivo do estudo é entender o porquê de certas coisas, como a escolha dos eleitores, a percepção dos consumidores, etc. (MARTINS, 2008, p. 23).

Segundo Moraes (2003), a pesquisa qualitativa pretende aprofundar a compreensão dos fenômenos a partir de textos já existentes ou de entrevistas, questionários, observações. Na pesquisa qualitativa, o pesquisador é ao mesmo tempo o sujeito e o objeto de suas pesquisas. Segundo Deslauries (1991):


O desenvolvimento da pesquisa é imprevisível. O conhecimento do pesquisador é parcial e limitado. O objetivo da amostra é de produzir informações aprofundadas e ilustrativas: seja ela pequena ou grande, o que importa é que ela seja capaz de produzir novas ações (DESLAURIES, 1991, p.58).


A escolha pelo questionário como instrumento de coleta de dados se deu pelo fato de os professores poderem levá-lo para casa e respondê-lo no horário e dia em que tivessem disposição para tanto. Estabelecemos um período de uma semana para que os questionários fossem devolvidos à pesquisadora, de forma que obtivéssemos uma adesão de todos os professores da escola. Destacamos que para garantir o anonimato dos participantes adotamos códigos de identificação dos sujeitos: a letra P, seguida dos números de 1 a 8.

Após devolvidos os questionários foram tabulados e os dados foram tratados utilizando a Análise Textual Discursiva (MORAES, 2003; MORAES; GALIAZZI, 2006, 2011), que se caracteriza como “uma abordagem de análise de dados que transita entre duas formas consagradas de análise da pesquisa qualitativa, que são a análise de conteúdo e análise de discurso” (MORAES; GALIAZZI, 2006, p. 118). Segundo Moraes (2003):


[...] pode ser compreendida como um processo auto-organizado de construção do novo emergente em que nova compreensão é comunicada e validada.” Compreensão em que novos entendimentos emergem de uma sequência recursiva de três componentes: desconstrução do corpus, a unitarização, o estabelecimento de relações entre os elementos unitários, a categorização, e o captar (MORAES, 2006, p. 118).


Pelo método indutivo foram criadas quatro categorias. Neste trabalho, apresentamos a categoria denominada “Dificuldades e Desafios enfrentados pelos docentes do Ensino Fundamental 1 em relação ao Ensino de Ciências”.


Dificuldades e Desafios enfrentados pelos docentes do Ensino Fundamental 1 em relação ao ensino de Ciências


Neste trabalho, buscamos realizar uma reflexão sobre as dificuldades e os desafios enfrentados pelos docentes do Ensino Fundamental 1 no exercício de sua ação pedagógica em ensino de Ciências e os possíveis problemas desse ensino. Documentos e orientações curriculares oficiais, tais como os Parâmetros Curriculares Nacionais – Ciências da Natureza (BRASIL, 1997) e a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) (BRASIL, 2017), apontam a importância da presença de conteúdos de Ciências desde os anos iniciais (1º ao 5º ano) do Ensino Fundamental. Os documentos consideram que a posse do saber científico pode contribuir para a compreensão do mundo e suas transformações, proporcionando um ensino que contribua para a formação de um sujeito capaz de interagir criticamente perante os desafios da sociedade.

Entretanto, a realidade nas salas de aula é bem diferente, o ensino de Ciências é trabalhado de forma precária, predominando aqueles conteúdos baseados na memorização, e algumas vezes essa disciplina não é nem ministrada aos alunos dessa etapa da educação, uma vez que os professores dão prioridade para as disciplinas de Língua Portuguesa e Matemática (FUMAGALLI, 1998, COLOMBO JR et al., 2012, RAMOS; ROSA, 2008).

Fracalanza, Amaral e Gouveia (1987) exploraram como o ensino de Ciências da Natureza era abordado nas séries iniciais do Ensino Fundamental (1º ao 5º ano) e ao analisarem depoimentos de professores confirmaram que o mesmo era apenas teórico, valorizando a memorização, sendo pouco eficaz. Porém perceberam nas falas dos professores o distanciamento entre o que eles pretendiam fazer e o que realmente faziam em suas aulas. De acordo com os autores, os professores relataram diversos fatores que dificultam um ensino de melhor qualidade, relacionando condições de trabalho, escassez de material e tempo reduzido para as aulas de Ciências. Porém não relataram, em nenhum momento, a formação precária que, possivelmente, proporciona insegurança no desenvolvimento de atividades (FRACALANZA; AMARAL; GOUVEIA, 1987). Essas condições perduram até a atualidade, uma vez que já se passaram anos desde a pesquisa realizada pelos autores.

Segundo Santos (2013), ao se trabalhar as dificuldades enfrentadas por professores de Ciências na realização de sua ação pedagógica é preciso considerar algumas situações pertinentes ao processo, desde as deficiências de sua formação inicial e as dificuldades encontradas para realização de uma formação continuada, passando pelas condições insuficientes que as escolas proporcionam aos seus alunos em relação a recursos didáticos e a estrutura física, além dos alunos com todas as suas concepções, incertezas e problemáticas.

Uma das dificuldades dos sujeitos desta pesquisa é a formação deficiente na área de Ciências da Natureza, o que repercute em sua prática pedagógica, de forma que os professores demostram que ensinar Ciências para eles é um desafio.

Assim, observamos que apenas três sujeitos da pesquisa eram pedagogos (37,5%), uma vez que na história da rede municipal de ensino investigada não houve ainda um concurso específico para pedagogos. Portanto, tanto para a Educação Infantil como para os anos Iniciais do Ensino Fundamental a exigência para o concurso era a licenciatura plena em qualquer área. Ainda participaram da pesquisa três docentes (37,5%) formados em Letras e dois formados em Matemática (25%).

Diante do exposto, ao analisarmos a formação inicial dos professores sujeitos da pesquisa, acreditamos que apenas os pedagogos vivenciaram a discussão das Ciências da Natureza durante sua formação. Mesmo assim, entendemos que a formação desses sujeitos foi suficiente para proporcionar segurança para trabalharem com a disciplina nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental 1.

Concordando com o exposto, Bricia e Carvalho (2016) ressaltam que os professores dos anos iniciais apresentam uma formação limitada em relação aos conteúdos científicos, o que confere pouca segurança para desenvolverem atividades de Ciências no Ensino Fundamental. O que também é destacado por Benetti (2011, p. 3), que afirma que o professor de Ciências dos anos iniciais do Ensino Fundamental 1 “muitas vezes, têm a incumbência de ensinar conteúdos que não fizeram parte de sua formação acadêmica universitária.”, o que remete à questão da insegurança do educador generalista (BIZZO, 2012) que, pela carência desses conteúdos em sua formação, acaba recorrendo ao livro didático e a textos retirados da internet, reduzindo a docência de Ciências à mera exposição de conceitos (BENETTI, 2011).

Diante disso, é importante que a formação inicial no curso de Pedagogia promova discussões sobre as práticas presentes em nosso cotidiano e seus pressupostos, a formação do professor de Ciências para os anos iniciais do Ensino Fundamental e a compreensão de saberes científicos, suas demandas e suas possíveis críticas, tornando claro o papel do professor generalista numa aula de Ciências e seus objetivos (BIZZO, 1994).

Uma questão apontada na literatura como dificuldade dos pedagogos em ensinar Ciências está relacionada ao domínio do conteúdo conceitual. Para Nuñez e Dias (2005), a formação de professores para os anos iniciais leva à preparação, muitas vezes, somente para o estudo de metodologias para o ensino de Ciências. Os conteúdos são desconsiderados causando, em muitos casos, a não realização efetiva das aulas de Ciências, visto que ter domínio de metodologias e não de conteúdo esvazia o sentido de se ensinar ciências.

Segundo Maués e Vaz (2006), a falta de domínio de conteúdo dos professores dos anos iniciais aparece como sendo consensual entre os pesquisadores. Análises quanto à formação de licenciandos em Pedagogia realizadas por Ovigli e Bertucci (2009) evidenciaram que não há critérios definidos para o ensino de Ciências na formação de pedagogos e que considerando as diferentes vertentes a que o curso se destina não há aprofundamento em nenhuma delas.

Nos questionários respondidos pelos professores identificamos que 62,5% dos sujeitos afirmaram que no curso de graduação não tiveram uma formação acerca dos conteúdos de Ciências da Natureza, como enfatiza o professor titular do 2º ano do Ensino Fundamental:


Não tive formação específica em Ciências da Natureza” (P.07, 2º ano).


Um dos docentes (12,5%) não respondeu ao questionamento. Outros 37% dizem que a formação existiu, porém foi insuficiente:


Tive esse contato com a disciplina nos conteúdos específicos do Curso de Pedagogia.” (P.03, 1ºano).

Eu tive na minha formação apenas uma disciplina que abordou o conteúdo de Ciências, acho que é pouco devido a importância da disciplina” (P.06, 5º ano).

Tive a disciplina, mas mesmo assim me sinto insegura nas aulas de ciências” (P.04, 4º ano)


Dos três, apenas um professor respondeu que vivenciou a discussão na formação inicial, e que essa contribuiu com a sua prática pedagógica de forma que ele utiliza até hoje aspectos desenvolvidos na disciplina:


Tive essa disciplina no curso de Pedagogia, no qual elaborei um projeto, que utilizo atualmente” (P.02, 3º ano).


Em relação à deficiência na formação do professor, Weissmann (1998) salienta que a falta de domínio e atualização em relação aos conteúdos escolares se configura como um dos maiores obstáculos no momento de ensinar e ainda discorre que nenhuma proposta didática conseguirá superar a dificuldade dos professores pedagogos em relação à falta de saber. Podemos ainda relacionar a pouca ênfase dada ao ensino de Ciências pelos professores nos anos iniciais, acrescida do “fato de os professores não se sentirem preparados para ensinar Ciências pode fazer com que eles também não gostem de ministrar está disciplina” (RAMOS; ROSA, 2008, p. 321).

Quando questionados se acreditavam possuir uma formação adequada para ministrarem aulas de Ciências nas séries iniciais, apenas um dos docentes afirmou que sim (12,5%), um dos docentes não respondeu ao questionamento (12,5%) e a maioria, seis docentes (75%), considera que não teve uma formação inicial docente que preparasse para ensinar Ciências, de maneira que esses docentes se sentem despreparados para tal ensino.

O que percebemos é que os educadores não estão preparados para trabalhar com os conteúdos científicos de forma a favorecer uma educação científica, isto é, os professores nem sempre compreendem o sentido complexo das ciências e por isso muitas vezes não são capazes de abordar essas questões com as crianças. Assim, ensinar ciências nas primeiras etapas da Educação Básica é um desafio diário e abrangente, pois só é capaz de realizar tal tarefa o professor que compreende seu papel social e questiona a sua própria prática pedagógica (GABINI; FURUTA, 2018).

Ainda hoje observamos uma desvalorização do ensino de Ciências nos anos iniciais do Ensino Fundamental, pois muitos educadores acreditam que, nesse momento, os alunos precisam aprender somente a ler, a escrever e a realizar as operações matemáticas, valorizando assim as disciplinas de Língua Portuguesa e Matemática (COLOMBO JR et al., 2012; FUMAGALLI, 1998). Podemos dizer que os sujeitos da pesquisa apresentaram uma opinião diferente, uma vez que destacaram a importância e defenderam o ensino de Ciências nessa etapa da Educação.

Ao serem questionados sobre quais eram os desafios enfrentados por eles com relação à prática do ensino de Ciências da Natureza nos anos iniciais do Ensino Fundamental, destacaram:


- Falta de tempo (50%);

- Falta de recursos, materiais, laboratórios e espaços adequados (37,5%);

- Conteúdo extenso dos livros didáticos (37,5%);

- Falta de capacitação, formação inicial e continuada (50%);

- Ausência de Ciências da Natureza na grade curricular (25%).

- Ausência de contextualização dos conteúdos propostos pelo currículo com a realidade dos alunos (12,5%).


Verificamos que metade dos docentes que participaram da pesquisa admite em seus discursos que um dos grandes problemas no ensino de Ciências consiste na falta de tempo para a área, inclusive destacaram que as prioridades são o letramento e as noções de matemática:


O tempo curto para aprofundar nos conteúdos que são muitos e também falta formação para abordar esses conteúdos.” (P.06, 5º ano)

Falta tempo devido à prioridade ser a alfabetização e as noções matemáticas.” (P08, 2º ano)

A quantidade de aulas para ensinar ciências é pouco, precisávamos de um número maior de aulas para poder desenvolver mais atividades referentes a estes conteúdos”. (P. 04,4º ano).


Portanto, apesar dos discursos dos professores ressaltarem a importância do ensino de Ciências, eles sinalizam que a falta de tempo, de materiais e a formação são entraves para a ocorrência do mesmo. Um dos docentes (12,5%) inclusive ressalta que a ausência de separação da área de Ciências da Natureza é um entrave:

Não ter a disciplina de Ciências separada das demais.” (P.05, 1º ano)


Observamos ainda que o processo de ensino realizado na maioria das escolas brasileiras não privilegia os conteúdos relativos às Ciências da Natureza, que são muitas vezes abordados de maneira superficial, fazendo com que os alunos e as alunas não consigam abstrair nessas informações algo que vá ser concretamente utilizado em seu dia a dia. Talvez porque o foco do Ensino Fundamental 1 nas escolas municipais seja a preparação para a realização das provas de avaliação da aprendizagem, tais como a Avaliação Nacional da Alfabetização (ANA), que é um dos instrumentos do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb), que avalia os níveis de alfabetização e letramento em Língua Portuguesa, a alfabetização em Matemática e as condições de oferta do ciclo de alfabetização, e a Prova Brasil que, conforme o censo escolar, é aplicada aos alunos de 5º e 9º anos do Ensino Fundamental nas redes estaduais, municipais e federais, de área rural e urbana, em escolas que tenham no mínimo 20 alunos matriculados na série avaliada. A Prova Brasil oferece resultados por escola, município, Unidade da Federação e país que são utilizados no cálculo do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb).

No que se refere aos principais desafios enfrentados pelos professores do Ensino Fundamental, três docentes (37,5%) citaram:


falta materiais concretos e laboratório de Ciências” na instituição de ensino. (P.01, 4º ano):

O desafio consiste em superar a falta de material e laboratórios adequados para as práticas no ensino de Ciências.” (P.06, 5º ano)

Seria interessante, nas aulas de ciências as aulas práticas, mas na escola não tem laboratório, assim acabamos usando apenas o livro didático” (P. 01, 4º ano).


Incorporar à prática docente e aos programas de ensino os conhecimentos contemporâneos em Ciência e Tecnologia relevantes para a formação cultural dos alunos é um grande desafio nas aulas de Ciências, uma vez que o professor precisa auxiliar seus alunos a enfrentarem os desafios que as novas tecnologias impõem e os capacitar para que possam ter acesso a essas novas ferramentas. Diante disso, surge a questão de que muitos alunos da escola pública municipal, vindos de famílias de baixa renda, não possuem acesso às novas tecnologias, como computadores, tablets, internet, etc. Além disso, a escola municipal não conta com laboratório de informática e outros recursos necessários, sendo esses fatores apontados pelos professores como uma dificuldade para o desenvolvimento das aulas.

Os professores, muitas vezes, utilizam a falta de laboratório para justificarem a não realização de atividades práticas, porém Lorenzetti (2000, p. 27) defende que nos anos iniciais a sala de aula e o meio ambiente são espaços que podem ser utilizados para essas atividades. “O local e os materiais são fatores de pouca relevância, mas o enfoque e a forma como serão apresentadas as atividades práticas contribuem para o desenvolvimento ímpar de aprendizagem significativa”. Observamos, por outro lado, que quando as escolas estão equipadas com materiais e equipamentos, os laboratórios permanecem frequentemente fechados, porque o professor está, de modo geral, despreparado para utilizá-los (LORENZETTI, 2000).

Três professores (37,5%) consideraram ainda que os conteúdos de Ciências da Natureza são muito extensos nos livros didáticos:


Cumprir todo o conteúdo, levando em consideração que temos apenas 90 minutos por semana.” (P.02, 3ºano)

Os conteúdos são em geral extensos e trazem muita informação e conceitos.” (P.04, 4º ano)

O tempo curto para aprofundar nos conteúdos que são muitos.” (P.06, 5º ano)


Percebemos então que os professores apontaram os conteúdos como extensos, sendo essa uma de suas dificuldades. Observamos que os professores utilizam o livro didático como único material de apoio, demonstrando que há falhas em sua formação, que não os capacitou para que sejam capazes de selecionar os conteúdos mais importantes. Assim, para metade dos professores, a dificuldade reside na falta de capacitação, de uma formação inicial e continuada que lhes permita melhor trabalhar com o ensino de Ciências da Natureza. Por fim, ao serem questionados, os professores apontaram sugestões para dinamizar as aulas de Ciências da Natureza, como:


- Construção / montagem de laboratórios de Ciências e informática (37,5%);

- Oferecimento de uma formação inicial / continuada na área (37,5%);

- Aumento da carga horária para a área (25%);

- Oferta de materiais de apoio (12,5%);

- Colocar Ciência na grade curricular (12,5%).


Evidenciamos que os docentes não apontaram como problemas apenas fatores externos, mas também admitiram falhas em sua formação inicial e continuada. É importante registrar que no processo formativo dos professores, a formação inicial é uma das fases do desenvolvimento profissional e que, por isso, possui algumas limitações cujos impactos têm imposto a necessidade da criação de oportunidades de formação continuada. Tais oportunidades podem auxiliar na minimização de algumas “dívidas” oriundas da fase inicial e, além disso, elas possuem um importante papel na qualificação profissional dos docentes e estão relacionadas com os avanços do conhecimento científico e com as dificuldades de realização da transposição didática (CHEVALLARD, 1991) do conteúdo das Ciências para as aulas do Ensino Fundamental, pois além de saber o conteúdo o professor precisa saber como ensiná-lo.


Conclusão


O presente artigo teve como objetivo apresentar as dificuldades e os desafios apontados pelos professores de uma escola pública municipal no que se refere ao ensino de Ciências. Consideramos, diante das respostas dos professores, que são vários os obstáculos, as dificuldades e os desafios para a concretização do ensino de Ciências no Ensino Fundamental 1, dentre eles destacamos: a falta de tempo, de recursos, materiais, de laboratórios e de espaços adequados, o conteúdo extenso dos livros didáticos, a falta de capacitação, a formação inicial e continuada, etc.

Os sujeitos deram destaque para a falta dos recursos, especificamente de laboratórios de Ciências, bem como para os conteúdos extensos e para a carência de formação que acaba gerando neles uma insegurança para ministrarem as aulas desta disciplina. Destacamos que mesmo com os desafios apontados pelos professores, eles apontaram que acreditam que as Ciências deveriam ser mais valorizadas no Ensino Fundamental 1.

Com relação a um dos principais desafios observados no trabalho - a falta ou a precária formação inicial dos professores - acreditamos que uma proposta de formação continuada em serviço que aborde os conteúdos de Ciências e uma adequada formação para a transposição pedagógica desses conteúdos é urgente e necessária, pois entendemos que por meio da formação continuada será possível suprir as dificuldades dos professores, permitindo que busquem, através dos conteúdos de Ciências, formar cidadãos críticos e reflexivos que possam participar ativamente em situações que envolvam os conhecimentos científicos e tecnológicos, além de iniciar a imersão do aluno em uma cultura científica desde os primeiros anos escolares.

O professor tem que estar preparado para dar suporte para os alunos imergirem no mundo do letramento científico. Não há como formar cidadãos sem professores altamente qualificados, munidos de materiais didáticos e condições de trabalho favoráveis para a promoção de uma educação científica voltada para a cidadania rumo à construção de uma sociedade mais democrática. Entendemos que o professor deve usar os conteúdos de Ciências da Natureza para fazer do seu trabalho em sala um espaço de transformação, produzindo conhecimento através da reflexão crítica. Com isso, estará se beneficiando com os resultados obtidos para solucionar problemas e alcançar seus objetivos.


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Recebido em: janeiro/2022.

Aprovado em: abril/2022.



1Secretaria Municipal de Educação de Catalão (SME), Catalão, Goiás, Brasil.

E-mail:sideliaribeiro@yahoo.com.br. ORCID: https://orcid.org/0000-0002-2317-3508.

2 Universidade Federal da Bahia (UFBA), Salvador, Bahia, Brasil. E-mail: adamswfernanda@gmail.com. ORCID: https://orcid.org/0000-0003-4935-5198.

3 Universidade Federal de Catalão (UFCAT), Catalão, Goiás, Brasil. E-mail: simara_nunes@ufcat.com.br. ORCID: https://orcid.org/0000-0002-7196-4398.


Revista Devir Educação, Lavras, vol.6, n.1, e-536, 2022.

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