ISSN: 2526-849X

Jovens em condições de vulnerabilidade social: fatores que auxiliam o desenvolvimento da resiliência

Young people in conditions of social vulnerability: factors that help the development of resilience

Jóvenes en condiciones de vulnerabilidad social: factores que ayudan al desarrollo de la resiliencia

Mya Fagundes¹

Ecleide Cunico Furlanetto²

Resumo

O presente artigo tem como objetivo discutir o conceito de resiliência e sua importância para a educação de jovens em situação de vulnerabilidade social. Para desenvolver este artigo, adotou-se a pesquisa qualitativa na vertente (auto)biográfica (PASSEGGI; SOUZA; VICENTINI, 2011). A princípio, foi realizada uma revisão de literatura sobre resiliência no âmbito da Educação, para compreender o contexto histórico da resiliência no Brasil. Como pergunta norteadora, ressaltamos: Por que algumas pessoas têm a capacidade de lidar com as adversidades melhor que outras? Analisaram-se as narrativas de jovens que vivem em situação de vulnerabilidade, egressos de uma Organização Não Governamental (ONG), situada numa comunidade em São Paulo. Participaram da pesquisa cinco jovens maiores de 18 anos com potencial para resiliência.

Palavras-chave: Educação; jovem; resiliência; vulnerabilidade social.

Abstract:

This article aims to discuss the concept of resilience and its importance for the education of socially vulnerable youth. To develop this article, qualitative research in the (auto)biographical aspect was adopted (PASSEGGI; SOUZA; VICENTINI, 2011). At first, a literature review on resilience in the field of education was carried out, in order to understand the historical context of resilience in Brazil. As a guiding question, we emphasize: Why do some people have the ability to deal with adversities better than others? The narratives of young people, who live in a vulnerable situation, coming from a Non-Governmental Organization (NGO), located in a community in São Paulo, were analyzed. Five young people over 18 years of age with the potential for resilience participated in the research.

Keywords: Education; young; resilience; social vulnerability.

Este artículo tiene como objetivo discutir el concepto de resiliencia y su importancia para la educación de jóvenes en situación de vulnerabilidad social. Para desarrollar este artículo, se adoptó la investigación cualitativa en el aspecto (auto)biográfico (PASSEGGI; SOUZA; VICENTINI, 2011). En primer lugar, se realizó una revisión de la literatura sobre resiliencia en el contexto de la Educación, con el fin de comprender el contexto histórico de la resiliencia en Brasil. Como pregunta orientadora destacamos: ¿Por qué algunas personas tienen la capacidad de enfrentar la adversidad mejor que otras? Analizamos las narrativas de jóvenes que viven en situación de vulnerabilidad, provenientes de una Organización No Gubernamental (ONG), ubicada en una comunidad de São Paulo. Participaron de la investigación cinco jóvenes mayores de 18 años con potencial de resiliencia.

Palabras clave: Educación; joven; resiliencia; vulnerabilidad social.

Introdução

O presente trabalho surge a partir da reflexão sobre a experiência docente e constitui-se em pesquisa que busca compreender, por meio da narrativa (auto)biográfica, os fatores que promovem a resiliência em jovens que vivem em condição de vulnerabilidade social em uma comunidade na cidade de São Paulo. Inicialmente, pretendeu-se contextualizar a pesquisa, que faz parte de uma dissertação de mestrado, ainda em curso (FAGUNDES, 2022). Na sequência, é discutido o conceito de resiliência, descrevendo a trajetória investigativa, assim como a definição dos autores que estão dando suporte ao estudo. Finalmente, são apresentados alguns resultados preliminares.

Durante dois anos, uma das autoras atuou profissionalmente numa Organização Não Governamental (ONG), situada em uma comunidade na cidade de São Paulo. A organização tem como objetivo ofertar proteção social para aqueles que se encontram em situação de vulnerabilidade e risco social, na faixa etária entre 14 e 59 anos. Para isso, oferecia cursos profissionalizantes, com duração de seis meses cada, nos períodos vespertino e noturno, além de alimentação, material didático e passeios culturais.

Durante o tempo em que lá esteve, fez algumas observações inquietantes que levaram à reflexão. Apesar de os jovens residirem em contextos de vulnerabilidade social, sem infraestrutura, essas limitações não eram obstáculo para alguns deles, pois mantinham o desejo de estudar para transformar suas condições de vida.

Estes jovens acreditavam que cabia a eles a responsabilidade de sair do lugar em que se encontravam, uma vez que não percebiam que o contexto no qual estavam inseridos era desfavorável e, por sua vez, dificultava sua ascensão social. Neste sentido, Paulo Freire (2019) afirma que a educação popular é a alavanca para a conquista de outros direitos fundamentais e que, se não houver justiça cognitiva, não haverá justiça social (FREIRE, 2019).

Partindo-se desta perspectiva, apontam-se a falta de recursos materiais, famílias desagregadas, e a ausência do Estado como algumas das variáveis que não obstaculizavam muitos jovens de frequentar, com assiduidade, os cursos disponibilizados pela ONG. Eles aderiam às aulas com entusiasmo e alinhavam-se às regras da instituição, além da cordialidade entre os colegas. Como as turmas eram heterogêneas, alguns jovens apresentavam atitudes violentas; outros, sintomas depressivos e narrativas suicidas com sinais de automutilação. Durante as aulas, nas rodas de conversa, os adolescentes tinham oportunidade de falar das angústias, dos sonhos, das dificuldades e dos medos em situações vividas por eles.

Durante o período de trabalho na instituição, algumas perguntas emergiram e levaram aos seguintes questionamentos reflexivos: Por que alguns alunos presentes na ONG desejam um futuro melhor por meio da escolarização e do trabalho, percorrendo caminhos socialmente considerados corretos, enquanto outros jovens da comunidade escolhem caminhos que os levam à paralisia ou mesmo à autodestruição? De onde vem a resiliência desses jovens decididos a conquistar suas oportunidades?

Com base no caminho percorrido, foi definido, então, como objetivo do trabalho, compreender quais fatores favorecem o desenvolvimento da resiliência em jovens em situação de vulnerabilidade social.

Para desenvolver esta pesquisa, foi realizada uma coleta de dados nas bases Scientific Electronic Library Online (SciELO) e Google Acadêmico, usando os seguintes descritores: educação, jovem, resiliência e vulnerabilidade social. Em função do grande número de trabalhos encontrados sobre o mesmo tema, adotou-se o seguinte critério: leitura dos resumos e seleção dos trabalhos que se aproximam do tema abordado nesta pesquisa, conforme as palavras-chave utilizadas.

A abordagem utilizada foi a pesquisa qualitativa, apoiada na vertente (auto)biográfica. Como procedimento de coleta de dados, adotou-se o método de narrativa, pois esta contempla elementos de reflexão que visam contribuir com o trabalho. Além disso, possibilita acesso às histórias de vida, considerando que nelas se situam as experiências vividas que, ao serem narradas, constituem uma história, manancial para a produção da pesquisa (PASSEGGI 2020). Esta abordagem permite compreender como esses jovens foram construindo suas histórias de vida e quais foram os circuitos de proteção que permitiram a eles conceder sentido as suas vidas. Participaram da pesquisa cinco jovens maiores de 18 anos, dois meninos e três meninas, egressos de uma Organização Não Governamental (ONG) situada numa comunidade de baixa renda em São Paulo. Diante da pandemia, o acesso aos jovens ocorreu por meio da plataforma digital que melhor se adaptou ao entrevistado, neste caso, o aplicativo WhatsApp. Para manter o anonimato dos participantes, foram solicitados codinomes pelos quais eles gostariam de ser chamados: Luna, Scorpion, Mel, Noah e Floquinho.

Sobre os procedimentos da pesquisa, cabe afirmar que as narrativas coletadas foram organizadas seguindo os dados dos diálogos cruzados sobre pesquisa (auto)biográfica. As contribuições de Souza (2014) com os diálogos cruzados possibilitaram a leitura compreensiva-interpretativa. Salienta-se que o interesse pela narrativa surgiu como possibilidade de conhecer as histórias de vida dos sujeitos e, dessa forma, poder compreender suas referências socioculturais. Assim, foi feita uma análise horizontal.

Os principais autores que deram suporte à investigação são: Furlanetto (2002: 2009a; 2009b); Furlanetto, Medeiros e Biasoli (2020) e Passeggi (2020), no campo da pesquisa com narrativas. No que se refere à Educação, foi estabelecido um diálogo com Freire (2019). Quanto à Psicologia, encontra-se apoio em Winnicott (1965); e quanto à sociologia, em Bauman (2005). Finalmente, tem-se em Cyrulnik (2001; 2004; 2005 e 2006) e Yunes (2020); Cassol; Antoni (2011); Garcia; Yunes (2011); e Yunes (2003) um referencial teórico para discutir o conceito de resiliência.

Resiliência, breve histórico

O termo resiliência não é novo nas disciplinas exatas. Entretanto, somente nos anos 1970 tornou-se familiar às ciências humanas. O conceito foi introduzido em 1807 pela Física e Engenharia, sendo Thomas Young, cientista inglês, o pioneiro a utilizá-lo em estudos sobre compressão e elasticidade (YUNES, 2003).

As discussões que surgiram, uma década depois, questionaram a utilização do termo invulnerável pelo seu teor incondicional, passando, assim, a ideia de que o ser humano é ilimitado para as provações. Diante disso, o acolhimento do termo resiliência pareceu, aos pesquisadores, mais adequado, pois sua base repousa em variáveis circunstanciais.

Martineau (1999) compreende que tomar alguns traços de uma criança como resiliente seria padronizar o comportamento, colocando-o em uma tabela capaz de mensurar a resiliência com base em sinais previamente estabelecidos, desconstruindo, desta forma, o caráter o dinâmico da resiliência.

O estudo da resiliência no Brasil era incipiente, com poucas publicações, até que a Psicologia passou a usar o conceito para explicar os estudos sobre indivíduos que respondem de forma diferente a eventos adversos e porquê alguns sujeitos não são afetados diante de situações de estresse.

À medida em que as pesquisas avançaram, o conceito recebe outras interpretações. Antoni, Barone e Kollerque (2011, p. 142) afirmam que este conceito é aplicado na Psicologia para explicar a capacidade do sujeito em vencer adversidades como divórcio, desemprego, violência intrafamiliar, morte e catástrofes que provocam desequilíbrio na rotina e na vida psíquica do sujeito.

O conceito passou, assim, por etapas, sendo a primeira classificada de diagnóstica, a qual agrupava os indivíduos bem-adaptados à adversidade. Nesta fase, o sujeito que enfrentava adversidades era observado e, por fim, classificado com base em alguns parâmetros que determinavam seu grau de resiliência (BRANDÃO; NASCIMENTO, 2019).

A segunda etapa limitava-se a fazer o diagnóstico. Nessa fase, surgiu a pergunta “o que” promove a resiliência e “como” ela se estabelece num sujeito e não em outro. Observou-se que a resiliência não era uma qualidade inata, mas um processo delicado que poderia ou não se instalar de acordo com a conjunção e combinação de variáveis numa temporalidade.

Na terceira fase, a proposta é de uma possível intervenção durante o processo de sofrimento para desencadear a marcha de resiliência por meio de mediação nos agentes estressores para que o trauma não se estabeleça, afirmam Brandão e Nascimento (2019).

Entretanto, aplicar o conceito de resiliência às outras ciências não é tão simples como descrito na Física e, por isso, talvez dependa de combinações de fatores para se fazer presente no indivíduo, afirma Goldstein (2012). Ao fazer uso do conceito, é preciso cautela e olhar com um distanciamento para evitar conclusões equivocadas.

Por sua vez, outros pesquisadores (MACHADO; LEGAL; TABOADA, 2006) afirmam que é preciso ser cauteloso ao fazer uso da noção de resiliência por conta de uma falta de clareza e fluidez assumidas pelo conceito na especificidade dos diferentes contextos. Para alguns autores, entre eles Cyrulnik (2001) e Goldstein (2012), o sujeito que desenvolve resiliência é capaz de estabelecer laços de confiança nas relações interpessoais, mantendo a postura otimista em relação à vida e externando alegria no seu modo de existir.

Assis et al. (2006) salientam a dificuldade em classificar uma pessoa como resiliente ou não, ressaltando a importância de reconhecer os problemas apresentados pelo sujeito e destacando as principais dificuldades para o reconhecimento da resiliência em crianças e adolescentes. Estas dificuldades se devem, primeiramente, pelo caráter subjetivo – é preciso ouvir como cada sujeito interpreta sua vida. Segundo, pela ausência de um marcador para o sucesso pessoal. Terceiro, há que se ter prudência para não cair no campo ideológico e criar mais uma cicatriz, aumentando, assim, a exclusão social.

Como se pode observar, há olhares complementares e até contraditórios sobre o mesmo objeto, o que suscita cuidado, evitando assim uma definição apressada. Deve-se pontuar que fatores desfavoráveis podem se fazer presentes na vida de qualquer sujeito, em diferentes fases da existência. Todavia, alguns sujeitos estão mais expostos a condições adversas indesejáveis, sobretudo aqueles residentes em regiões de pobreza que ficam fora do escopo do governo. Alguns sujeitos afetados pelas singularidades desses cenários podem ter baixo repertório para lidar com os desafios, o que dificulta o desenvolvimento da resiliência. A esse respeito, Peltz, Moares e Carlotto afirmam:

A noção de vulnerabilidade é composta por elementos que agravam a situação de risco ou impedem respostas satisfatórias diante de situações adversas e deve ser compreendida em três planos básicos: o individual, que está relacionado aos comportamentos, porém não reduzidos a uma ação voluntária, mas associados às condições objetivas do meio natural e social e ao grau de consciência sobre tais comportamentos; o segundo plano é o social, ligado ao acesso à informação, aos serviços de saúde, condições de bem-estar social; e o terceiro está ligado ao institucional, ao desenvolvimento de ações por instituições específicas visando diminuir, ou eliminar os riscos que tornam os indivíduos mais vulneráveis [...] (PELTZ; MORAES; CARLOTTO, 2010, p. 89-90).

Ao examinar as questões acima, observa-se que as moradias nos bolsões de pobreza são caracterizadas pela carência, pois estão aquém do alcance do poder público. Parte do acolhimento vem, portanto, de ações voluntárias, de ONGs e igrejas.

Olhar de Bauman sobre a vulnerabilidade

Ao analisar a sociedade pós-moderna, Bauman (2005) descreveu as características do sujeito que foi afastado de direitos constitucionais dentro do progresso da modernidade e destacou as consequências da globalização, nas quais as pessoas vão sendo impelidas para guetos de pobreza. Estes sujeitos são lançados à própria sorte, pois a falta de capacitação os tirou da marcha do progresso e os tornou desinteressantes para a sociedade do capital. Estas vidas são olhadas e tratadas como refugo humano que não tiveram permissão para ficar nos espaços socialmente aceitos, uma vez que não se encaixam na cadeia que se retroalimenta pelo ciclo de produção e consumo.

A exclusão é naturalizada pelo sujeito que é culpabilizado pelo modo de vida, sobretudo o jovem, conforme observou-se empiricamente naquele ambiente onde a ONG está geograficamente inserida. Bauman (2005) e Freire (2020) olharam para a questão dos sujeitos desfavorecidos de perspectivas distintas.

Freire (2020), com mais otimismo, acreditou que a Educação mudaria o cenário e que, havendo o processo consciencial por parte dos oprimidos, todos poderiam fincar sua bandeira na malha social: “Daí a crítica permanentemente presente em mim à malvadez neoliberal, ao cinismo de sua ideologia fatalista e sua recusa inflexível ao sonho e à utopia” (FREIRE, 2020, p. 16).

Bauman (2005), de forma mais enfática, acredita que não há lugar para todos no mundo, pois a pobreza sentencia os sujeitos que vivem numa sociedade regida pelo capitalismo parasitário. Este produz indivíduos eternamente devedores, presos aos sistemas financeiros, numa eterna incerteza, em relações parasitárias em que o mais fraco sustenta o mais forte (BAUMAN, 2005).

Análise e discussão dos resultados

Como já foi salientado no início, os jovens participantes desta pesquisa são egressos de uma ONG situada numa comunidade de São Paulo. Nesta seção, apresentam-se algumas categorias encontradas nas narrativas analisadas e confirmadas pela teoria. A ordem em que aparecem foi definida pela importância atribuída pelos jovens. Os resultados apontam de forma recorrente para a importância do papel materno na formação da montagem caracterológica.

Os achados da pesquisa confirmam as afirmações da literatura que destacam a família com papel importante de mediação dos primeiros aportes de resiliência (CYRULNIK, 2001; CASSOL; ANTONI, 2011; GARCIA; YUNES, 2011; YUNES, 2011).

Embora vivendo num ambiente desfavorável com os desafios postos pela comunidade, os jovens demonstram nas suas narrativas ter recebido uma rede de proteção advinda primeiro das mães e dos outros membros da família, em seguida da escola, especialmente dos professores tutores de resiliência. A escola surge como espaço de possibilidades, em que as relações sociais permitem o crescimento, o desenvolvimento da empatia e a construção de vínculos fortes, principalmente na figura de alguns professores, que, segundo os jovens, se importaram com suas vidas para além da sala de aula.

A seguir apresentamos alguns fragmentos das narrativas. Um dos primeiros aspectos identificados na literatura e apoiados nos resultados foi a família como rede de apoio, principalmente a figura da mãe.

Emocionou-se ao falar da mãe… afirmou desejar ser 10% dela: “Como inspiração sempre tive minha mãe né, porque minha mãe é empregada doméstica, teve uma época que ela trabalhava em dois empregos, teve época que eu não via minha mãe, ela saía cedo e voltava tarde. Meu pai também trabalhou um tempo como agricultor para depois trabalhar numa firma. Sempre tive minha família como base” [Luna].

Quem sempre me inspirou foi meu pai, eu sempre me inspirei muito no meu pai, e eu sempre falei eu quero ser igual meu pai quando eu crescer, ele foi, ele é minha maior inspiração até hoje entende? [Floquinho].

Quem foi meu ídolo, e ainda é, é a minha mãe, que é uma guerreira, ela é que sempre mostrou para mim o caminho certo para mim. Não desistiu das coisas, para mim nunca desistir de nossos sonhos. No esporte meu pai, que sempre me apoiou, e ele fala que sim eu fosse capaz [Mel].

Então, meus líderes vêm da minha família, em primeiro lugar minha mãe, primeiramente porque ela sempre foi uma mulher batalhadora, assim, sempre conseguiu tudo com os próprios esforços e primeiro porque sempre inspirei assim pelo caráter dela, pelo jeito que ela vive a vida, vive até hoje, e por ela ter sido resiliente né, resiliente com as situações da vida [Noah].

É difícil um líder né, mas hoje em dia quando eu olho para trás eu acredito que os meus primeiros líderes foram meus pais. E depois disso, bom faz parte de um conjunto né, não tem como instituir um líder a curto prazo, eu acho que é isso, são um conjunto de pessoas que vão nos inspirando porque ao longo da minha vida é... por questões de dores passadas, sentindo o lado mais cru da vida, a gente vai conhecendo a vida que tem que viver, porque é uma questão de forças opostas, no embate [...] falei sobre mim, sobre a minha vida, esse meu período de depressão quando teve toda uma questão muito problemática no fundamental, e contei sobre a minha trajetória com a depressão, o quanto foi difícil, quanto eu não aceitava ajuda, o quanto eu não reconhecia esse sentimento. Fui abrindo com meus pais, sobre o conflito e a sentir algo que doesse, mais do que eu estava preparado para sentir no momento, eu não queria enxergar que cada indivíduo faz a sua própria escolha e age como ele quer e não como você quer. Cada indivíduo não é um espelho, não dá para sobrepor o que a gente quer no outro, isso eu aprendi numa sessão de terapia, há uns anos atrás com o psicólogo (Posto de Saúde) [Scorpion].

A descrição sobre a família, principalmente sobre a mãe, nos remete ao conceito de Winnicott³ (1965) da mãe suficientemente boa, capaz de criar um ambiente favorável ao desenvolvimento da criança. Vale ressaltar que a mãe suficientemente boa não é mãe perfeita. Como é possível notar, a mãe surge como a figura norteadora dos valores basilares, seguida do pai. Ainda que a mãe trabalhasse em dupla jornada e dispusesse de pouco tempo com a família, conforme mencionou Luna, fora suficientemente boa. No tempo diminuto de dedicação aos filhos, a mãe ofereceu exemplo de caráter e ensinou os primeiros passos de como transitar pelo ambiente da comunidade sem se contaminar com os problemas inerentes ao local da moradia.

Luna, Mel e Noah afirmam encontrar na mãe a guerreira aquela que lhes mostrou o caminho e incentivou os sonhos nos quais se espelham para a trajetória de vida. Essa afirmação remete a “Ciranda das mulheres sábias”.

Toda árvore possui por baixo da terra uma versão primeva de si mesma. [...] o mesmo acontece com a vida de uma mulher. Como a árvore, não importa em que condições ela esteja acima da terra, exuberante ou sujeita a enorme esforço [...] por baixo da terra existe uma “mulher oculta” que cuida do estopim dourado, aquela energia brilhante, aquela fonte profunda que nunca será extinta (ESTÉS, 2007, p. 31).

As narrativas demonstram que os jovens se apropriaram muito bem dos vínculos afetivos com a família. Diante disso, podem-se confirmar as afirmações de autores como Cyrulnilk (2001) que elege os cuidadores iniciais como principal circuito de proteção e geradores de resiliência.

Ao serem perguntados sobre o papel da escola e do professor, eles demonstram a importância das relações estabelecidas entre o sujeito e o mundo por meio da escola para a formação dos valores, como é possível observar nos fragmentos abaixo:

A escola foi mais no período do fundamental, que foi o período em que eu mais me senti apoiada pelos professores principalmente pela professora de matemática e pela professora de português porque dava para ver no olhar delas que elas não queriam o aluno aprendendo matemática, mas o aluno aprendendo sobre a vida, entendeu? [...] Totalmente, professora, porque, é bem básico isso porque quando os pais estão fora a gente passa mais tempo na escola do que dentro de casa, no período da escola assim e são 4 horas convivendo com pessoas diferentes, com professores diferentes e você acaba pegando um certo afeto. Um professor que não se preocupa só com matéria dada, ele se preocupa em olhar para o aluno, ver se ele está bem, tipo assim, captar alguma coisa no aluno, sabe? Um professor que se importa com o aluno mesmo quando ele está fora da escola [Luna].

Eu acho que falta alguma coisa, não vou repetir aqui da falta de infraestrutura, mas falta algo no professor como por exemplo que aconteceu comigo e essa moça, era professora de física, e ninguém gostava dela, e eu consegui estabelecer uma conexão com ela, através da poesia, nós dois gostávamos de poesia, faltam essas conexões, eu consegui ir além da matéria dela, com ela principalmente, porque eu vi os alunos destratando ela, e eu pensava isso não tá certo, a questão não é se eu vou usar ou não uma fórmula de Bhaskara, uma fórmula da física, a questão é que toda disciplina envolve um conhecimento, faz com que o cidadão tem o conhecimento mesmo que você não use [Scorpion].

Na escola fundamental, os professores, graças a Deus, sempre foram ótimos, na escola que eu estudei, e eu tive uma boa educação, tive ótimos professores, e fui sempre bem elogiado por eles, pela minha forma de me expressar, pelas provas, que eu ia bem, pela educação que eu tinha, e quando tinha reunião os professores sempre me elogiam para minha mãe, eu me sentia feliz. Professores, principalmente a professora da quarta série, que ela foi a professora que me marcou, pelo jeito dela. Teve uma professora também na primeira série que me ensinou muito, aprendi a ler e escrever com ela foi ótima professora, para mim, na minha base, assim, e durante os anos no fundamental eu sempre aprendi bastante com eles. Infelizmente alguns alunos não ia para estudar, ia para bagunçar, aí passar o tempo, mas eu sempre fui para estudar, e também socializar né que também faz parte da escola, mas o foco era estudar e aprender, aquilo que eu precisava, então, eu tenho orgulho e agradecimento. Um bom professor é aquele que sabe entender o aluno. Não só explicar a matéria, mas saber se ele entendeu realmente, se o aluno está aprendendo, a todo momento, para saber se ele tá se desenvolvendo. E também o professor não é só na área da educação, mas também pode ajudar na área sentimental, com lado pessoal do aluno, que às vezes ele tá passando por um problema de família, um problema interno, que ele não consegue aprender, vai para escola mas tá com a cabeça em outro lugar, se o professor perceber isso, e conseguir interferir para ajudar o aluno a resolver os problemas, o professor acaba se destacando, porque tem um lado humano do professor, isso que é o mais importante, não só o lado profissional [Noah].

Um bom professor para mim é aquele que não só faz parte da escola, que vou chegar na sala e vou passar a lição, porque para mim, eu sei que o aluno ele é desinteressado, o aluno se sente forçado a ir para escola. Então, se o professor não souber brincar, não souber levar uma parte também para o lado do amigo, não só para o lado da escola, eu acho que não vai ser legal a aula, porque eu acho que todas as vezes que eu ficava feliz, por exemplo, eu odiava aula de matemática, a professora chata, mas minha conselheira, porque eu odeio matemática. Brincava, conversava sobre a nossa vida, então tipo assim, é questão da professora saber dividir as coisas, saber tipo ser legal, que nem a senhora, a senhora ficava na sala de aula e brincava com a gente. A senhora não só ficava naquela aula chata, a gente amava a sua aula, todo mundo ficava feliz, quando era sua aula, entendeu? [Floquinho].

Então... eu acho que o professor bom para mim o legal, é aquele que não só faz a parte dele, mas é seu amigo e no final das contas ele fica feliz pela sua vitória. A senhora não tem orgulho de ver os seus alunos vencendo na vida? Então tipo assim, é assim numa amizade, até hoje eu tenho contato com vários professores [Mel].

Ao refletir sobre o papel da escola e dos professores, fica claro que os jovens se apropriaram da representação que o espaço escolar tem como espaço de aprendizado e também dos vínculos, tanto com os colegas quanto com os professores que lhes proporcionaram afeto e apoio.

A escola é o segundo espaço onde as crianças aprendem habilidades necessárias e comporá o repertório para a vida toda. Nela, elas ampliam perspectivas e descortinam oportunidades. Os fragmentos de narrativas acima indicam, pois, um ideal de professor: aquele sujeito que vai devolver o olhar ungido de reconhecimento, que vai incentivar o desenvolvimento pessoal e o sucesso escolar, que se posiciona como amigo e se preocupa com as questões pessoais do aluno. A esse respeito, Farjado, Minayo e Moreira (2013) refletem sobre a dimensão relacional da resiliência como estrutura educacional, entendendo que o apoio do professor é fundamental neste processo de adaptação do ser humano diante de circunstâncias desfavoráveis. As autoras destacam, ainda, alguns pontos que devem ser considerados na relação entre professor e aluno:

Comunicação se for eficiente permitirá o elo e a troca com os outros. Capacidade de assumir a responsabilidade por sua própria vida. Ter consciência limpa, o que significa não ceder a culpabilização, aceitar responsabilidades, reconhecer erros e superá-los; ter convicções sobre alguns valores essenciais que permitem avançar e suportar adversidades (FAJARDO, MINAYO, MOREIRA, 2010, p. 763).

Portanto, é necessário conhecer as pontes que levam à resiliência. Aliás, muitos professores já o fazem intuitivamente. Embora as narrativas dos jovens estejam na direção do “professor amigo”, os professores têm o compromisso de elevar a vida acadêmica do aluno. Obviamente, os professores acabam sendo exigidos demasiadamente quando pesa sobre os ombros responsabilidades que deveriam ser distribuídas entre a instituição escolar, a família e a sociedade. Embora os jovens estudantes precisem ser conscientizados sobre a responsabilidade com seus aprendizados, o aprendizado só ocorre se for afetivo, o que, no engajamento Walloniano, acontece como um rizoma que autoriza o acontecer psíquico. Por isso, os jovens destacaram essas qualidades nos professores sem as quais parece que um bloqueio se estabelece: “Cognição é o processo no qual o mundo de significados tem origem. À medida que o ser se situa no mundo, estabelece relações de significação, isto é, atribui significado à realidade em que se encontra” (MOREIRA; MESINI, 2001, p. 12). Afeição, significado e cognição formam uma teia sem a qual o avanço acadêmico do jovem fica prejudicado. O professor precisa de condições favoráveis de trabalho e aporte psicológico diante da precarização da educação para transitar com eficácia nesta polissemia que compõe o aprendizado.

Nos fragmentos abaixo, os jovens falam das suas concepções acerca do esporte como ferramenta de transformação social, desenvolvimento cognitivo e qualidade de vida:

Por ora, eu só faço corrida quando eu volto do trabalho. Então correr é o meu esporte do momento, eu gosto de sentir o cansaço de me sentir ofegante [Scorpion].

Só se você sair e procurar na praça ou em parques da região, aqui, onde eu moro, não. O esporte, muitas vezes, pode ser um objeto de superação para muitas pessoas. Vejo notícias, assim, de pessoas que poderiam ter desistido de tudo e, por causa de algum esporte que elas aprenderam e começaram a praticar, elas superam algumas coisas que acontecem na vida delas. Eu acho que toda atividade que você tem algum apreço, ela se torna importante para você. Para outras pessoas podem ser um livro, escutar música, vai de pessoa para pessoa [Luna].

Pratico esporte, eu jogo futebol e sim, eu acho muito importante, tanto que quando eu passei para as piores fases da minha vida quando eu fazia esporte, eu esqueci e foi com o esporte que eu aprendi a superar. Para “mim” não esquentar a cabeça, eu ia correr na praça, eu ia jogar bola, isso toda vez eu voltava com a mente mais ampla, parecia que eu pegava a carga carregando nas minhas costas e jogava ela no momento em que eu fazia esporte. Eu acho muito importante mesmo, eu acho que se todo mundo fizesse, as pessoas estariam com a saúde mental bem mais elevada [Floquinho].

Sim, eu pratico, jogo futebol, eu acho muito importante praticar esporte porque faz bem à saúde, ajuda também a parte psicológica e você também acaba se distraindo, conhecendo novas pessoas que eu acho isso bem legal [Mel].

Sim, eu pratico, jogo futebol. Eu acho muito importante praticar esporte, porque faz bem à saúde, ajuda também a parte psicológica e você também acaba se distraindo conhecendo novas pessoas que eu acho isso bem legal [Noah].

Os valores preconizados no esporte, como superação, formação de caráter, autoestima e, principalmente, o fortalecimento psicológico, foram mencionados nas narrativas. Embora nem todos fossem praticantes assíduos de esportes, nota-se o espírito de superação nas vozes. Observam-se o apego à vida e o olhar otimista para o mundo, apresentam-se abertos para socializar com novos colegas. Eles reconhecem que estão sujeitos a obstáculos, entretanto se manifestam dispostos a enfrentá-los.

Por essência, o esporte é competitivo e leva os atletas aos seus limites, pois além da cobrança externa há a cobrança interna. Esta soma de cobrança pode ser considerada uma adversidade na vida dos atletas, por isso o ambiente precisa ser saudável para evitar desistência, levando em consideração algumas variáveis conforme mencionam Sanches e Rubio (2011, p. 835): “São considerados, por exemplo, no contexto esportivo, as circunstâncias de treinos e competições, condições climáticas, preparação física, técnica, tática e psicológica do competidor e do adversário”. Os aspectos mencionados pelas autoras são requisitos importantes a todo esportista. Entretanto, os jovens pesquisados não dispõem de aparato ideal para sua prática. Eles contam com campos improvisados ou têm de correr nas ruas ou praças, ou seja, buscando caminhos alternativos para a superação de dificuldades e dos desconfortos psíquicos, como mencionaram alguns jovens. Nota-se, assim, no relato dos participantes da pesquisa o esforço para criar as oportunidades no dia a dia.

Nos fragmentos abaixo, há o desejo genuíno de prosperar. Contudo, neste momento o trabalho foi considerado mais urgente para conquistar a autonomia. Eles afirmaram o desejo de buscar uma faculdade num segundo momento. Demonstraram, portanto, primeiro compreender o cenário para depois encontrar estratégias e acatar os estudos.

Meus projetos de vida eu andei mudando algumas coisas e agora eu quero fazer jornalismo, não porque eu fale bem ou porque eu quero aparecer nas telinhas, mas porque eu sinto a necessidade de documentar, porque a mídia já documenta, mas eu quero trazer uma abordagem que bote essa situação na sua mão, porque por um lado o problema da pobreza não diz respeito só a mim, diz respeito a todo o Brasil porque a gente faz parte dessa problematização. Por que tornou essa questão algo tão sério, algo que parece inviável, e sem solução, mas a gente também faz parte de ter naturalizado, sabe? A gente se acostumou com essa ideia de conviver com a insatisfação de não ter futuro positivo para o Brasil [Scorpion].

Então... professora, de faculdade eu pretendo fazer logística, ou como o professor Marcos falou eu seria uma ótima engenheira de produção, sei disso, não sei, não faço a mínima ideia [Luna].

Meus planos para a vida profissional e pessoal, minha vida profissional é crescer profissionalmente, crescer, ser o que eu não sei ainda o que eu quero ser, e isso entristece bastante porque tem gente que na minha idade já começou a faculdade, e eu comecei e não continuei por não gostar. Então, não me encontrei ainda, infelizmente, mas eu também não fico me martirizando por isso, né, porque não vale a pena. Às vezes eu ficar martirizando por isso, eu não consigo encontrar. Então, “tô” lutando para tentar encontrar algo que eu goste né, mas é que eu quero crescer, eu quero, meu sonho é ser rica, né, ter dinheiro demais, porque eu tenho uns pensamentos muito grandes, eu quero viajar, quero viver mesmo que no luxo, como falo, mas eu não sei como eu vou chegar lá, ainda, eu só penso que eu vou chegar. Eu tenho força para chegar lá, eu sei que eu vou chegar, mas eu não sei como chegar lá, não escolhi uma profissão certa para isso [Floquinho].

Meu plano de vida pessoal é cada dia mais me tornar uma pessoa melhor querer ajudar as pessoas. Meu plano profissional quero crescer muito e servir de inspiração para diversas pessoas e mostrar que sim, mulher tem voz no futebol, “tá” crescendo bastante. Eu quero ser inspiração para outras garotas também [Mel].

Quanto ao estudo, eu tenho vontade de ser psicólogo ainda, não perdi essa vontade. Quero fazer faculdade um dia, não sei como, quando eu vou começar, mas eu tenho vontade e ou na psicanálise. “Tô” em dúvida ainda por causa dessa pandemia, ainda não corri atrás disso, mas eu tenho vontade sim. Eu “tô” trabalhando de auxiliar administrativo, no trabalho que eu gosto, um escritório, quantas transportadoras, mas é onde eu me sinto bem, individual o trabalho eu me saio bem, eu tenho um certo domínio no que eu faço. Estou me desenvolvendo a cada ano, crescendo assim um conhecimento, tanto na informática, como no campo de atendimento que eu converso com pessoas, faço ligações, e eu “tô” evoluindo minha forma de pensar e de falar, e espero que eu consiga alcançar cargos maiores [Noah].

Com relação às questões sobre trabalho e estudo, eles demonstram as dúvidas da maioria dos jovens da mesma faixa etária, ou seja, não sabem ao certo qual profissão escolher. Scorpion externa o desejo de promover mudanças por meio da profissão de jornalismo sobre questões sociais prementes que dizem respeito, não somente a ele, mas à sociedade como um todo. Negreiro e Rocha (2018, p. 2) apontam, neste contexto, que: “[...] acentua-se que a apreensão da resiliência não se restringe à superação momentânea de determinada dificuldade, mas um caminho a ser trilhado pela via da construção de uma consciência crítica do indivíduo”.

Conforme mencionou Noah no fragmento acima, ele está em busca do desenvolvimento interno, de formas de pensar e falar com transformações importantes da história de vida do sujeito. Enquanto eles estão experimentando a vida e produzindo reflexões com o conhecimento acumulado, poderão vislumbrar resoluções para suas vidas. São autorretratos que se formam de reflexões individuais, mas também das pressões sociais: “Quando invocamos a memória, sabemos que ela é algo que não se fixa apenas no campo subjetivo, já que toda vivência, ainda que singular e autorreferente, situa-se também num contexto histórico e cultural” (SOUZA, 2007, p. 63).

Considerações possíveis

Esta pesquisa buscou investigar como os jovens de comunidade em situação de vulnerabilidade apropriam-se da resiliência. Incialmente, fez-se um apanhado sobre o conceito de resiliência, revisitando sua origem e mostrando os diferentes olhares sobre esse conceito. Foram consultadas as pesquisas de Cyrulnik (2001), Cassol e Antoni (2011), Garci e Yunes (2003) para compreender como a resiliência pode ser desenvolvida em jovens de família em situação de risco. Os resultados indicaram que a resiliência pode ser desenvolvida desde os primeiros traços de humanidade no ambiente familiar.

Foi possível observar também que a escola tem papel fundamental no fortalecimento da criança e do jovem, fazendo-os acreditar nos sonhos e desfazer possíveis estigmas gerados no ambiente de vulnerabilidade. Além disso, os valores preconizados no esporte – como superação, formação de caráter, autoestima – são também pontes para se chegar à resiliência. Essas percepções singulares foram possíveis por meio da pesquisa (auto)biográfica, usando as narrativas como coletas de dados.

Essa abordagem permitiu verificar a perversidade que a desigualdade social impõe, principalmente, aos jovens que são abandonados à própria sorte. Desta forma, observa-se a necessidade premente de políticas públicas voltadas ao desenvolvimento de ambientes considerados vulneráveis, de modo a promover outros referenciais e outros olhares e não eternizar a naturalização da pobreza e suas trágicas consequências para que os jovens não continuem alijados do processo educacional por serem desfavorecidos financeiramente. Procuramos apresentar esta contribuição sobre os fatores que promovem a resiliência não para transferir mais responsabilidades aos jovens, que já são sentenciados pela exclusão da vida acadêmica e precisam ser resilientes para conviver com os desafios que estão postos, mas para provocar o debate sobre a necessidade de o Estado assumir sob suas responsabilidades as comunidades de moradias precárias, contando com a contribuição da sociedade com redes de apoio para os jovens em situação de vulnerabilidade.

Este trabalho não se encerra, deste modo, aqui. Muitas são as variáveis que precisam ser estudadas em ambiente de vulnerabilidade e, portanto, são necessárias outras pesquisas com outros olhares e abordagens para melhor compreender os fenômenos, desdobramentos e riscos daqueles que foram empurrados para os guetos de pobreza.

Referências

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Recebido em: dezembro/2021.

Aprovado em: abril/2022.

1 Universidade Cidade de São Paulo, Brasil - e-mail miafagundes45@gmail.com

2 Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, PUC/SP, Brasil.

E-mail ecleide@terra.com.br

3 Winnicott acompanhou crianças separadas da família durante a Segunda Guerra Mundial e construiu sua trajetória pesquisando o relacionamento mãe/bebê como unidade psíquica. Observou cada etapa do desenvolvimento infantil e identificou a importância da presença da mãe desde os primeiros anos de vida na construção da identidade.

Revista Devir Educação, Lavras, vol.6, n.1, e-524, 2022.

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