O
ensino remoto em Minas Gerais: uma análise pelo ciclo de políticas
Emergency remote teaching in Minas Gerais: a policy cycle analysis
Enseñanza remota
de emergencia: en Minas Gerais: un análisis del ciclo de políticas
Cláudio
Lúcio Mendes[1]
Tielle
Alves Souto[2]
Resumo
Este
artigo trata do Ensino Remoto Emergencial (ERE) proposto em consequência da
pandemia de SARS-CoV-2, focando-se no programa Regime Especial de Atividades
Não Presenciais (REANP) para a Educação Básica apresentado pelo governo do estado
de Minas Gerais. O objetivo do estudo é compreender o cenário do ensino remoto
e as possíveis dificuldades relacionadas à sua viabilização e ao seu
funcionamento, em especial porque recomendou-se uma soma de esforços para o
emprego de mecanismos on-line, televisivos, radiofônicos e/ou impressos. Com o
intuito de cumprir o objetivo, inspirou-se teórico-metodologicamente na noção
de ciclo de políticas de Stephen Ball. Analiticamente, refletiu-se sobre o
contexto de influência proposto por Ball que, no caso do REANP, foi fortemente
produzido em consequência às condições sanitárias e ao isolamento social.
Tratou-se também dos contextos da produção de texto – relacionando o cenário
mineiro com o nacional para a elaboração textual do REANP – e da prática – trazendo
aspectos sobre acesso às tecnologias digitais, condições de trabalho,
realidades sociais e divulgação de informações por meios on-line sobre o que é
o REANP e suas possíveis interpretações em realidades locais. Ao se analisar o
REANP a luz do ciclo de políticas, concluiu-se duas coisas: 1) o ensino escolar
já apresentava dificuldades que aumentaram durante a pandemia, ficando
gritantes as relacionadas à formação de professores, à valorização da profissão
docente e às condições materiais para o trabalho com as tecnologias digitais;
2) no pós-pandemia, se as políticas educacionais continuarem a dar a mesma
atenção periférica a tais dificuldades, os problemas sociais, políticos e de
ensino tenderão a se tornar mais agudos.
Palavras-chave:
Política educacional; Ensino remoto emergencial; Ciclo de políticas; Pandemia;
Tecnologias digitais.
Abstract
This article deals with the
Emergency Remote Teaching (ERT) proposed in consequence of the SARS-CoV-2
pandemic, focusing on the Special Scheme of Non-Presential Activities (REANP)
program for students from 3 to 14 years old presented by the state government
of Minas Gerais. The objective of the study is to understand the emergency
remote teaching scenario and the possible difficulties related to its
feasibility and operation, especially since it recommended a sum of efforts for
the use of online, television, radio and/or printed mechanisms. In order to
fulfill the objective, the theoretical and methodological inspiration was
Stephen Ball's notion of policy cycle. Analytically, we reflected on the
context of influence proposed by Ball that, in the case of the REANP, was
strongly produced as a result of sanitary conditions and social isolation. It
also addressed the contexts of textual production – relating the Minas Gerais
scenario to the national one for the textual elaboration of REANP – and of
practice – bringing aspects about access to digital technologies, working
conditions, social realities and dissemination of information through the
Internet about what is REANP and its possible interpretations in local
realities. In analyzing the REANP in light of the policy cycle, two things were
concluded: 1) school teaching already had difficulties that increased during
the pandemic, with the most obvious being those related to teacher training,
valuing the teaching profession, and the material conditions for working with
digital technologies; 2) in the post-pandemic, if educational policies continue
to give the same peripheral attention to such difficulties, social, political,
and teaching problems will tend to become more acute.
Keywords:
Educational policies; Emergency remote teaching;
Policy cycle; Pandemic; Digital technologies.
Resumen
Este artículo trata del
Enseñanza Remota de Emergencia (ERE) propuesto como consecuencia de la pandemia
de SARS-CoV-2, centrándose en el Programa de Actividades Especiales No
Presenciales (REANP) para niños de 3 a 14 años presentado por el gobierno del
estado de Minas Gerais. El objetivo del estudio es comprender el escenario de
la enseñanza a distancia y las posibles dificultades relacionadas con su
viabilidad y funcionamiento, especialmente porque se recomendó una suma de
esfuerzos para el uso de Internet, televisión, radio y/o mecanismos impresos.
Para cumplir el objetivo, la inspiración teórica y metodológica se basó en la
noción de ciclo político de Stephen Ball. Analíticamente, reflexionó sobre el
contexto de influencia propuesto por Ball que, en el caso de REANP, se produjo
fuertemente como consecuencia de las condiciones sanitarias y el aislamiento
social. También abordó los contextos de producción de textos – relacionando el
escenario de Minas Gerais con el nacional para la elaboración textual de REANP
– y la práctica – trayendo aspectos de acceso a tecnologías digitales, condiciones
de trabajo, realidades sociales y difusión de información a través de medios
online sobre qué es REANP y sus posibles interpretaciones en las realidades
locales. Al analizar el REANP a la luz del ciclo político, se concluyeron dos
cosas: 1) la educación escolar ya presentaba dificultades que se incrementaron
durante la pandemia, quedando patentes las relacionadas con la formación del
profesorado, la valorización de la profesión docente y las condiciones
materiales para trabajar con las tecnologías digitales; 2) en la post-pandemia,
si las políticas educativas siguen prestando la misma atención periférica a
estas dificultades, los problemas sociales, políticos y educativos tenderán a
agudizarse.
Palabras clave: Políticas educativas; Enseñanza remota de emergencia;
Ciclo de políticas; Pandemia; Tecnologías digitales.
___________________________________________________________________________
Introdução
O estudo sobre políticas e programas públicos para o uso das
tecnologias digitais na educação já vem sendo realizado há alguns anos[3].
No entanto, o cenário pandêmico modificou nossas abordagens, acelerando de
diversas maneiras o emprego dessas tecnologias e as políticas que as envolvem.
A pandemia causada pelo novo coronavírus (SARS-CoV-2) que se iniciou no Brasil
em 2020, trouxe consigo, além de incertezas em relação à saúde e outros
setores, uma inquietação na educação. Tal inquietação está relacionada aos
desafios que a educação teria em relação ao distanciamento social e como o
ensino seria desenvolvido (SAMPAIO, 2020). Em diversos cenários, recomendou-se
uma soma de esforços para que gestores da educação criassem ou reforçassem,
dentro de suas condições e possibilidades, plataformas de aulas on-line em
todos os níveis de ensino. Nessa lógica, a solução inicial encontrada foi o Ensino
Remoto Emergencial (ERE)[4]
– que nas unidades da federação assumiu diversos nomes na Educação Básica –, apoiando-se
em mecanismos on-line, televisivos, radiofônicos e/ou impressos (estes últimos,
entregues aos estudantes pelos mais diversos meios) (RONDINI et al, 2020; CASTIONI et
al, 2021). Com esse cenário vieram igualmente os
desafios aos professores, aos alunos e às famílias.
Diante de tais questões, torna-se central compreender como
políticas e programas públicos estão sendo modificados, repensados e, em
especial, propostos para enfrentar essas dificuldades e necessidades. Não
podemos esquecer que são nas políticas e nos programas que se configuram iniciativas – tanto antes, durante
e após pandemia – interessadas em: 1) estabelecer diálogos entre os componentes
curriculares e o letramento midiático e informacional; 2) elaborar as propostas
às escolas e aos professores no enfrentamento às incertezas advindas do uso de
tecnologias com intencionalidades pedagógicas acerca do desenvolvimento dos
estudantes (ALMEIDA;
VALENTE, 2016). Nesse
cenário, uma questão nos instiga: quais políticas e programas educacionais vêm
sendo propostos com o intuito de desenvolver processos de ensino e aprendizagem
significativos e possíveis de serem realizados de maneira remota? O presente texto
busca apontar medidas adotadas para reordenar e reorganizar o ensino e a
aprendizagem – a partir da noção de ERE – apresentadas pelo governo do estado
de Minas Gerais por meio do Regime
Especial de Atividades Não Presenciais (REANP) focado
na Educação Básica.
O objetivo do estudo é
compreender o cenário do ensino remoto emergencial e as possíveis dificuldades atreladas
à sua viabilização e ao seu funcionamento. Com o intuito de cumprir tal
objetivo, nos inspiramos na noção de ciclo de políticas de Stephen Ball. Com a
intenção de compreender como essas dificuldades foram (ou não) sanadas,
realizou-se uma análise nos materiais/ferramentas disponibilizados pela
Secretaria de Estado de Educação de Minas Gerais (SEE/MG). No desenvolvimento
do texto, na próxima seção trataremos do ciclo de políticas de Ball,
descrevendo os cinco contextos que a compõe e justificando os motivos de nos
concentrarmos em três deles: de influência, da produção de texto e da prática.
Na terceira seção, refletimos acerca do contexto de influência que, no caso do
REANP, foi fortemente produzido em consequência às condições sanitárias e ao
isolamento social. Na seção seguinte, trataremos dos contextos da produção de
texto – relacionando o cenário mineiro com o nacional para a elaboração textual
do REANP – e da prática – trazendo aspectos anteriores à pandemia no tocante às
tecnologias digitais, bem como aspectos contemporâneos sobre condições de
trabalho, realidades sociais e divulgação de informações por meios on-line explicando
o que é o REANP e suas possíveis interpretações em realidades locais. Por
último, apresentamos nossas considerações finais.
O
ciclo de políticas de Ball
Partimos do princípio que o enfoque do ciclo de políticas, inicialmente
formulado por Ball e Bowe – com contribuições posteriores de Anne Gold e outros
autores – pode auxiliar em uma melhor compreensão e apreciação de como se
desenvolvem as estratégias e as trajetórias das políticas e programas públicos
educacionais. Consideramos que é “um referencial útil para a análise de
programas e políticas educacionais”, podendo ser empregado na apreciação crítica
da “trajetória dos mesmos, desde sua formulação inicial até a sua implementação
no contexto da prática e seus efeitos” (MAINARDES, 2006, p. 48). Além disso, o
“ciclo de políticas focaliza a formação do discurso de uma política, a
implementação dos sujeitos com enfoque nos processos micropolíticos e a ação
dos profissionais que lidam com elas no contexto da prática” (MAINARDES;
MARCONDES, 2009, p. 48). Nesse sentido, podemos investigar o processo sendo
desenvolvido e direcionado às políticas em educação, envolvendo os agentes que
participam de suas proposituras e implementações, incluindo aqueles que
sofrerão seus efeitos, colocando em prática tais políticas e como elas podem
ser reinterpretadas.
Inicialmente,
a abordagem do ciclo de políticas foi formulada por Stephen
Ball e Richard Bowe (1992, p. 100) considerando que ao se “pesquisar o ambiente
escolar exige-se que consideremos não apenas o Currículo Nacional” – no nosso
caso, a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e/ou as propostas curriculares
dos entes federativos –, “mas também como os vários atores escolares
interpretam a Lei, como se faz a gestão local das escolas”, além de levar em
conta “os processos de capacitação realizados por diferentes órgãos, grupos e
indivíduos de diversas formas”. Nesse sentido, o ciclo de políticas configurava-se
em um método focado na análise de políticas, não dizendo respeito unicamente à explicação
do que elas são. Assim “o ciclo de políticas não tem intenção de ser uma
descrição” pura e simples das políticas. É, acima de tudo “uma maneira de
pensar sobre elas e saber como as mesmas são feitas” (MAINARDES; MARCONDES,
2009, p. 305). Ball e Bowe (1992) tentaram caracterizar o processo político – nessa
configuração primária, ainda de maneira muito amarrada e fixa –, introduzindo
um ciclo contínuo constituído por três facetas sequenciadas e temporalmente
separadas: 1) política proposta, referindo-se “à política oficial, relacionada
com as intenções [...] do governo” suas estruturas de poder, especialmente o
legislativo e os órgãos de educação, e “também [as] intenções das escolas,
autoridades locais e [de] outras arenas onde as políticas emergem”; 2) política
de fato, basicamente centrando-se nos “textos políticos e textos legislativos
que dão forma à política proposta”; 3) política em uso, tratando-se dos “discursos
e [das] práticas institucionais que emergem do processo de implementação das políticas
pelos profissionais que atuam no nível da prática” (MAINARDES, 2006, p. 49).
Logo
após, na busca de avançar e superar a rigidez e ambiguidade da primeira
configuração, ampliando as análises da variedade de intenções e disputas no
processo político, Bowe, Ball e Gold (1992) propuseram uma outra configuração,
não apresentando divisão temporal ou sequencial, na tentativa de superar um
tipo de análise feito por etapas lineares. Essa nova configuração constituiu-se
por três contextos: o contexto da influência, o contexto da produção do texto e
o contexto da prática. O contexto da influência é aquele que geralmente as
políticas públicas são iniciadas e os discursos construídos, sendo “nele que
grupos de interesse disputam para influenciar a definição das finalidades
sociais da educação, sendo as redes sociais uma atuante dentro e em torno de
partidos políticos, do governo e de processos legislativos” (MAINARDES, 2006,
p. 51). Podemos concluir que é nesse contexto que os conceitos adquirem
legitimidade legal e normativa e formam os discursos que dão base às políticas.
Já
no “contexto da produção de texto, os textos políticos comumente estão ligados
a linguagem do interesse público, e não são necessariamente [transparentes] e
coerentes” em sua argumentação e fundamentação científica, “podendo ser também [narrativamente]
contraditórios”, atendendo a noções ideológicas de grupos organizados ou de
interesses morais, religiosos ou fundamentalistas (MAINARDES, 2006, p. 52).
Sendo assim, podemos entender que políticas são intervenções textuais,
carregando limitações materiais e possibilidades. O texto, no entanto, é apenas
uma pequena parte (porém, uma parte importante) da produção, sendo empregado
“para indicar que as políticas são interpretadas e materializadas de diferentes
e variadas formas. Os atores envolvidos (no caso, os professores) têm o
controle do processo e não são ‘meros implementadores’ das políticas”
(MAINARDES; MARCONDES, 2009, p. 315). As respostas desse contexto têm
consequências reais, e elas são vivenciadas no terceiro contexto, o da prática,
na qual as políticas ganham sentido.
O
contexto da prática evidencia a “política em ação, [salientando] a política
sendo submetida a interpretações e recriações pelos atores locais” (professores,
gestores e comunidades). Dessa maneira, políticas pensadas em outros contextos
“podem sofrer mudanças e transformações significativas, inclusive serem
recriadas” (LIMA et al, 2018, p. 4). O ponto importante nisso reside no
protagonismo assumido pelos profissionais que estão na escola, considerando-se para
análise o que acreditam e pensam. Nessa perspectiva, o ciclo conduz a um tipo
de análise que permite contemplar o espaço escolar como um local de criação e
recriação das políticas oficiais. Também é importante “verificar e compreender
as rearticulações e embates que se processam em cada um dos contextos desde
onde a política é gestada, passando pela produção do texto até sua chegada ao
local onde os agentes a vivenciam” (MAINARDES; GANDIN, 2013, p. 150).
Após
outras discussões, ponderações, experimentações em pesquisas e críticas
recebidas, Ball (1994) amplia e refina a noção de ciclo de políticas com dois
outros contextos: o dos resultados e o da estratégia política. Com o contexto
dos resultados – uma espécie de alongamento ou refinamento do contexto da
prática –, a preocupação está em se pensar os impactos ou efeitos relacionados
às “interações com as desigualdades existentes” (MAINARDES, 2006, p. 54). Ball
(1994) não
está tratando da relação de causa e efeito, especialmente porque muitas vezes
só procuramos quais foram as causas quando tomamos ciência de seus efeitos
(ROSE, 1996). Ele traz a ideia do efeito no sentido foucaultiano, buscando
identificar que papel as práticas desempenham, com o intuito de “analisar [...]
o que as práticas fazem” (DREYFUS; RABINOW, 1995, p. 135), sem dar atenção à
noção de origem que a busca da causa carrega. Efeito, então, seria a descrição
da expressão de como as práticas políticas gerais (propostas ou em consequência
do REANP) e localizadas (por exemplo, as propostas e os usos feitos de uma mesma
proposta por um grupo de professores em uma determinada escola) são “organizadas
[e em conjunto] operam” tanto de maneira ampla como específica (DREYFUS;
RABINOW, 1995, p. 115). Assim, a abordagem dos efeitos, gerais e específicos,
“sugere-nos que a análise de uma política” educacional envolve investigar as suas
“várias facetas[,] dimensões [e] implicações (por exemplo, a análise das
mudanças e do impacto em/sobre currículo, pedagogia, avaliação e organização) e
[as suas] interfaces [...] com outras políticas setoriais e com o conjunto das
políticas” (MAINARDES, 2006, p. 54-55).
O contexto de estratégia política busca, da
mesma forma, articular cenários de micropolítica com de macropolítica, objetivando
a “identificação de um conjunto de atividades sociais e políticas que seriam
necessárias para lidar com as desigualdades criadas ou reproduzidas pela
política investigada”. Assim, relacionada centralmente ao contexto da
influência, as estratégias políticas gerais e locais devem ser levadas em conta
ao se tratar dos “embates e situações sociais específicos” (MAINARDES, 2006, p.
55), nacionais e globais envolvidos em políticas educacionais. Nesse sentido,
as políticas não são simplesmente implementadas de maneira estratégica,
seguindo o ordenamento posterior a sua elaboração e promulgação. Nos espaços de
micropolítica, as políticas educacionais, muitas vezes, “são ignoradas,
dispensadas ou esquecidas, e isto porque a prática é sempre contingente, complexa
e instável” (ROSA, 2019, p. 8). Como esses aspectos eram, em parte,
marginalizados na primeira elaboração, vem daí igualmente a direção escolhida
por Ball ao refinar sua noção de ciclo de políticas, procurando trazer aos
escopos de análises a ideia de que as “políticas estarão sempre sujeitas à
erosão e ao enfraquecimento de suas bases, por efeito da ação ‘encarnada’ das
pessoas que são seu objeto” (BALL, 1994, p. 10-11). Entendemos que Ball nos
oferece uma caixa de ferramentas para analisar as políticas educacionais, não
“uma teoria totalizante que nos diz como o mundo funciona” (MAINARDES; MARCONDES, 2009, p. 313).
De qualquer forma, esses mesmos autores nos lembram que
o contexto dos resultados/efeitos é
uma extensão do contexto da prática (infraestrutura disponível, culturas
profissionais, processos de interpretação e tradução, pressões externas etc.).
Já o contexto da estratégia política está relacionado ao contexto da
influência, uma vez que integra o processo pelo qual as políticas são mudadas (MAINARDES;
MARCONDES, 2009, p. 306).
Neste texto, trabalharemos
dando atenção aos contextos da produção de texto, de influência e da prática
(re)configurados no contexto pandêmico. Entendemos que “a abordagem do ciclo de
políticas traz várias contribuições para a análise de políticas, uma vez que o
processo político é entendido como multifacetado e dialético, necessitando
articular as perspectivas macro e micro” (MAINARDES, 2006, p. 55). Não negamos,
com base na literatura, que os cinco contextos “estão inter-relacionados”, não
tendo divisões entre dimensões “tempora[is] ou sequencia[is]” e não sendo
“etapas lineares. Cada um desses contextos apresenta arenas, lugares e grupos
de interesse e cada um deles envolve disputas e embates” (MAINARDES, 2006, p.
50). Reafirmamos, no entanto, que em nossas análises estaremos focados nos
contextos de influência, da produção de texto e da prática (figura 1),
entendendo-os, como “os três contextos principais” (MAINARDES; GANDIN, 2013, p.
158) com igual importância para nossas reflexões.
Figura
1: contextos de análise da política educacional. Fonte: adaptado de Mainardes,
2006, p. 51.
No
escopo teórico apresentado e simplificadamente exposto na figura acima,
parece-nos ser “possível orientar a investigação de políticas educacionais”
tratando do “contexto das influências (discursos, organismos, sistemas)”
abordando também o “da produção dos textos políticos” e o do “contexto da
prática (avaliação em larga escala e os municípios), [no qual] as políticas
podem ser reconstituídas” (SANTOS, 2014, p. 265). Com efeito, podemos nos
inspirar na noção de ciclo de políticas no intuito de compreender melhor o
contexto estudado, partindo da premissa que ainda há muitas perguntas a serem
respondidas sobre políticas e programas públicos educacionais (AVELAR, 2016).
Concluindo esta seção, evidenciamos que o ciclo de políticas
“envolve uma diversidade de procedimentos para coleta de dados” (MAINARDES,
2006, p. 59). No entanto, neste texto, nos focamos em analisar os documentos
postos à consulta e orientação de docentes, gestores, alunado e família ligados
à Rede Pública Estadual de Ensino de Minas, que passamos a descrever.
A influência: a educação básica e o ensino remoto
As políticas e os programas em educação estão ligados a processos sociais
complexos, nos quais se encontram imbricados valores, opções éticas e outras
posições que podem movimentar o espaço escolar. A compreensão do ciclo de
políticas – na abordagem analítica de políticas e programas educacionais – tem
por objetivo, além de gerir a investigação, também compreender os aspectos
relacionados a suas implementações, possíveis falhas e seus possíveis acertos.
Para tanto, o trabalho de Ball promove o emprego de ferramentas conceituais que “podem
ser trabalhadas em diferentes contextos”, permitindo “que pesquisadores em
educação de diferentes países utilizem suas ferramentas analíticas” (AVELAR,
2016, p. 3).
As políticas e os programas educacionais são considerados, no
contexto deste trabalho, como processos sociais formulados e implementados, muitas vezes, em
situações inerentes a um contexto específico de influência. Refletirmos a
partir desse ponto de vista é especialmente importante durante uma pandemia
inesperada que forçou a reconstrução e recriação de políticas e
programas educacionais. Em específico, a produção do REANP está ligada aos conhecimentos, valores e princípios que nortearam várias ações atreladas às necessidades sanitárias
em tempos de Covid-19. Analisar o REANP é pertinente não só pelo que a
autoridade instituída fez, como também pelo que renunciou ante a situação da
pandemia, tornando-se “ainda mais relevante para se compreender o [seu]
alcance” (OLIVEIRA et al, 2021, p. 87).
O ano de 2020 foi palco de aceleradas
rupturas sem precedentes em todas as esferas. A pandemia causada pelo vírus SARS-CoV-2
instaurou mudanças que afetaram e atravessaram a vida humana. Diante de tantas
alterações, incertezas e questionamentos – transformando as relações humanas
nas suas facetas sociais, econômicas, políticas etc. – foi preciso ter um novo
olhar sobre as vivências e posturas de todos os cidadãos. A prioridade em
reordenar e reorganizar a educação afetou acentuadamente as políticas
educacionais, modificando o funcionamento do ensino para formatos remotos,
suspendendo as aulas presenciais no Brasil e em vários países (UNESCO, 2021). Com
base nesse cenário e dentro de sua competência, o Conselho Nacional de Educação
(CNE) aprovou em plenária virtual, em 2020, o parecer CNE/CP nº5/2020 (BRASIL,
2020), propondo novas diretrizes sobre a configuração dos calendários dos
sistemas e redes de ensino no Brasil, sendo tais medidas abrangentes a todas as
etapas, níveis e modalidades de ensino. Nesse mesmo parecer, discute-se a importância em
“considerar as fragilidades e desigualdades estruturais da sociedade brasileira
que agravam o cenário decorrente da pandemia em nosso país”, apontando como
aspectos mais delicados “as diferenças de proficiência, alfabetização e taxa
líquida de matrícula relacionados a fatores socioeconômicos e étnico-raciais”,
além das condições extremamente desequilibradas econômica e socialmente de
desemprego e renda, somadas àquelas de “acesso ao mundo digital por parte dos
estudantes e de suas famílias”. Santana e Sales (2020) apontam a dificuldade em
abordar essa problemática, considerando a heterogeneidade e complexidade das
circunstâncias educacionais no Brasil: sua dimensão continental, suas
diferenças culturais, seus profundos desequilíbrios sociais e econômicas.
A migração abrupta do ensino
presencial na direção do ensino remoto trouxe à tona desafios na elaboração do
texto e na prática em consequência ao REANP[5].
Para que o ensino remoto fosse liberado, foi promulgada a medida provisória nº
934, que trata da flexibilização do calendário letivo na Educação Básica e do
cumprimento de 200 dias letivos, exigindo apenas o cumprimento de 800 horas de
aula ao ano. Essa medida entrou em vigor e foi convertida em Lei (nº 14.040, de
18 de agosto de 2020) (BRASIL, 2020a). A partir dessa lei, o governo de cada
estado poderia definir seu posicionamento em relação às aulas on-line com o
objetivo de que todo o material pedagógico oferecido para aulas por meios
digitais pudesse ser considerado atividade curricular. No entanto, segundo uma
pesquisa do Instituto Nacional de Estudos Educacionais Anísio Teixeira (INEP), houve
muitas dúvidas por parte dos governos acerca desses posicionamentos, pois não
sabiam como reorganizar os calendários escolares, considerando as condições
particulares de cada rede, escola, professor, estudante e sua família (BRASIL,
2021). Essas dúvidas são decorrentes, igualmente, da falta de coordenação
nacional do executivo federal sobre muitos aspectos que envolvem a pandemia,
não seguindo sequer o bê-á-bá proposto pela Organização Mundial de Saúde (OMS)
e defendido por infectologistas sérios e pautados na Ciência: testes massivos,
uso de máscaras e isolamento/distanciamento social[6].
De maneira específica, é possível observar que, desde o início do reordenamento
e da reorganização da educação, a falta de planejamento e competência do executivo
federal para tratar com o assunto dificultou muito o funcionamento das
propostas e políticas educacionais (MENDES; SILVA, no prelo).
Há limitações graves, com
problemas de acesso à Internet e às ferramentas tecnológicas, especialmente de
professores e alunos da Educação Básica de escolas públicas. Muitos professores
tiveram que se adaptar ao modelo de ensino remoto utilizando ferramentas que
estavam ao seu alcance, não necessariamente as mais adequadas, dificultando a
aprendizagem de muitos alunos. Segundo Bonilla et al (2020), entre as famílias
mais pobres, a dificuldade de estudantes e pais está também em acompanhar as
atividades propostas, principalmente em razão das desigualdades sociais
existentes. Para as famílias cujos pais estão em trabalho remoto (dentre aqueles
que ainda têm trabalho), o acompanhamento dos filhos tem entrado em conflito
com o próprio trabalho, sendo ainda mais dificultado pelo volume de atividades
profissionais e domésticas (MENDES; SILVA, no prelo).
As diferenças entre níveis e
oportunidades de aprendizagem já eram relevantes no ensino regular entre alunos
de classes sociais diferentes e entre alunos de escolas públicas e privadas no
Brasil (BONILLA et al, 2020) e no mundo (UNESCO, 2021). Com a pandemia, somado
a acentuação das diferenças sociais, vários trabalhos apontam para a perda de
aprendizagem dos alunos, com o crescimento do abandono escolar, tudo isso
sofrendo algum tipo de influência da falta de coordenação do Sistema Nacional
de Educação pelo executivo federal (CAVALCANTE et al, 2020; COUTO et al, 2020; CONJUVE
et al, 2021; OLIVEIRA et al, 2021; MENDES; SILVA, no prelo). Nesse sentido,
Perrenoud (2000) considera que a preocupação em ajustar o ensino às condições
dos alunos e professores não surge apenas no respeito às pessoas e ao bom senso
pedagógico. Tal preocupação faz parte de uma certa exigência de igualdade.
Segundo o autor, a indiferença às diferenças transforma as desigualdades
iniciais – por questões culturais, sociais e econômicas – em desigualdades de
aprendizagem e, por consequência, desigualdades sociais, culturais e econômicas
do alunado das camadas populares ao longo de suas vidas.
Com o ensino presencial
tornando-se uma alternativa de alto risco, foi preciso buscar meios para o seu
desenvolvimento de forma remota e mais segura, mesmo sem a coordenação do MEC
ou outras instâncias do executivo federal. Por um lado, é corriqueira na
literatura a discussão sobre como as políticas e os programas educacionais relacionados
ao emprego de tecnologias digitais nas escolas não superaram os obstáculos atrelados
à falta de estrutura, de equipamentos adequados e de preparação/capacitação dos
professores no manuseio de suportes tecnológicos (ALMEIDA;
VALENTE, 2016; OLIVEIRA et al, 2021; MENDES; SILVA,
no prelo). Por outro lado, com “[…] a suspensão das atividades presenciais”
gerou-se “a obrigatoriedade dos professores e estudantes migrarem” para
atividades on-line, na tentativa de transferir e transpor – muitas vezes,
infelizmente, com pouco êxito – “metodologias e práticas pedagógicas típicas
dos territórios físicos de aprendizagem” em relação ao “que se tem apelidado de
ensino remoto de emergência” (MOREIRA; SCHLEMMER, 2020, p. 07). Vejamos com
mais detalhes como, nos textos do REANP, foram colocadas ações para a prática
do cotidiano escolar a partir dessas séries de
influências descritas.
O texto e a prática: ensino remoto emergencial mineiro
Neste artigo, naquilo que concerne às
reflexões acerca do REANP – um programa emergencial voltado para a implementação
do ensino remoto –, são fundamentais as relações entre as noções sobre a
política como texto e como prática. Segundo Mainardes (2006, p. 59), os textos
dizem “respeito aos documentos oficiais” que, mesmo depois de publicados, devem
ser interpretados como “produtos inacabados com múltiplas possibilidades de
interpretação e entendimento”, a mercê de “embates, discussões, conflitos que
são decodificados e interpretados de acordo com os atores envolvidos”. Com essa
forma de ver, tais aspectos são percebidos não só nos textos das políticas e dos
programas públicos. Igualmente estão presentes em seus processos de
implementação na prática. Temos os exemplos das políticas e dos programas que
propõem textualmente o emprego das tecnologias digitais no ensino, no entanto,
aquilo proposto não se materializa no cotidiano e na prática escolares (ALMEIDA; VALENTE, 2016; OLIVEIRA
et al, 2021).
Mesmo assim, entendemos que é o texto que leva a propor determinadas
estratégias e mecanismos, sendo uma modalidade primária de análise, “pois as
políticas são escritas, enquanto que” os outros contextos estão mais
relacionados às ações e práticas cotidianas, incluindo “o fazer [das] coisas”
(MAINARDES; MARCONDES, 2009, p. 305). Ponderamos igualmente que “políticas [...] educacionais [...]
são pensadas e em seguida escritas” tendo como parâmetro as “melhores escolas
possíveis [...], com pouco reconhecimento de variações de contexto, em recursos
ou em capacidades locais” (MAINARDES; MARCONDES, 2009, p. 306). Levando em conta
esses aspectos a nortearem nossas reflexões, abordaremos com mais detalhes o
REANP nos contextos de produção do texto e da prática.
A
Secretaria de Estado da Educação de Minas Gerais (SEE/MG) institucionalizou o
REANP/MG em 17 de abril de 2020, por meio da Resolução SEE nº 4310/2020. O
REANP propõe que os processos sejam executados essencialmente por meios
digitais, indicando a necessidade de se manter e reforçar a interação do
professor com os alunos e entre os alunos, por meio do uso de tecnologias digitais
e, em algumas situações, empregando materiais impressos[7].
Segundo a mesma resolução, o REANP
constitui-se de procedimentos
específicos, meios e formas de organização das atividades escolares
obrigatórias destinadas ao cumprimento das horas letivas legalmente
estabelecidas, à garantia das aprendizagens dos estudantes e ao cumprimento das
Propostas Pedagógicas, nos níveis e modalidades de Ensino, ofertados pelas
escolas estaduais (MINAS GERAIS, 2020).
Ao longo de 2020 e 2021, foram criadas e
reformuladas “as ferramentas para você estudar em casa com segurança
neste período de isolamento social” (grifo nosso), constituindo, ao mesmo
tempo, o REANP. No site Estude em Casa[8]
descreve-se os materiais/ferramentas do REANP propostos pela SEE/MG. Na página inicial
do site, a forma de apresentação do discurso sobre as chamadas “ferramentas”
tem como interlocutor o aluno – por isso o uso do pronome pessoal você grifado
acima. Encontramos aí uma técnica de endereçamento e captura dos sujeitos alvo
(os estudantes) na busca de torná-los um público enformado pelos objetivos do
documento (ELLSWORTH, 2001). No site Estude em Casa, versão 2021, são
apresentadas as seguintes ferramentas a explicarem e constituírem o REANP
mineiro:
a)
Programa de Estudos Tutorados (PET): consiste em apostilas
mensais que reúnem atividades, orientações de estudos e conteúdos (da Educação
Infantil ao Ensino Médio) de cada componente curricular, sendo elaboradas com base
no Currículo Referência de Minas Gerais (CRMG) e na BNCC.
b)
Se Liga na Educação: programa transmitido pela Rede Minas, de
segunda a sexta-feira, das 7:00 às 12:30. São quatro horas de aulas gravadas,
além de um tempo ao vivo (11h15 às 12h30), no qual os estudantes poderão
interagir, por meio das redes sociais, com os professores no estúdio.
c)
Conexão Escola: é um aplicativo para celular apresentado
como mais uma forma de acesso ao PET, aos materiais de orientação, às aulas síncronas
com os professores, às aulas on-line gravadas (via Google Mett) e às aulas da
Rede Minas. Ao longo de 2020 apresentou vários problemas de funcionalidade (OLIVEIRA
et al, 2021) e, em 2021, foi reformulado e renomeado de “Conexão Escola 2.0”[9].
Vem acompanhado pelo documento Guia Prático (Aplicativo Conexão Escola) que
apresenta informações acerca do uso pelo público-alvo (professores, alunos e
gestores). Nele, disponibiliza-se o endereço de um curso autoformativo, on-line, com carga horária de
60 horas (Google for Education: recursos e possibilidades)[10],
considerado essencial na utilização eficaz e eficiente de todas as ferramentas
disponíveis na plataforma Google for Education para acesso por computadores e aplicativos
de celular.
d)
Documentos Orientadores: foram elaborados com o intuito de
trazer a baila algumas medidas didático-pedagógicas e normativas tomadas para a
consolidação do REANP, sendo constituídos pelos seguintes documentos: 1) Guia
prático para o Início do Ano Letivo 2021; 2) Documento Orientador REANP
(versões 2020 e 2021); 3) Educação em Tempo Integral; 4) Ensino Fundamental e
Médio; 5) Educação Profissional e Curso Normal de Nível Médio.
e)
Fortalecimento da Aprendizagem: são documentos balizadores
para gestores, professores e alunos com atividades relacionadas aos cuidados
(de aprendizagem, emocional, didático-pedagógico) com os atores da escola,
especialmente o alunado, como também orientações relativas ao cumprimento do
calendário escolar e da carga horária anual estabelecidos pelo CNE (BRASIL,
2020). Fazem parte dessa ferramenta os documentos: 1) Escola Acolhedora; 2)
Acolhimento remoto sem uso de conectividade; 3) Reforço Escolar e seu anexo; 4)
Os Melhores Sábados Letivos da sua Vida e seu anexo; 5) Intervenção Pedagógica
e seu anexo[11].
f)
Se liga na Libras: apresenta vídeos em libras tratando de
vários conteúdos escolares e aspectos da cultura da Língua de Sinais, assim
como sua história, o contexto que os surdos vivem e suas particularidades.
g)
Projeto Vamos aprender: é um projeto do Conselho Nacional
de Secretários de Educação (CONSED) e da União Nacional dos Dirigentes Municipais
de Educação (UNDIME), com parceria e apoio da Fundação Roberto Marinho, da Fundação
Lemann, do Itaú Social, dentre outras organizações da sociedade civil. Oferta
programas televisivos de 30 a 40 minutos para todas as idades de estudantes, do
Ensino Infantil ao Ensino Médio, elaborados com base na BNCC[12].
i)
Legislações, dúvidas comuns e contato/suporte: é a ferramenta que
reúne várias informações concernentes ao desenvolvimento do REANP. Em “legislações”
temos deliberações, Decretos e outros documentos publicados no Diário Oficial
do Estado. Em “dúvidas comuns”, encontram-se as respostas mais corriqueiras,
questões sobre as ferramentas disponibilizadas, suas características e outras tratativas
do regime de teletrabalho do servidor. Para demais informações solicita-se que
o usuário acesse o “Fale Conosco”. O “Contato/Suporte” é um formulário Google a
ser preenchido com os dados do interessado e sua solicitação acerca de questões
atreladas ao PET, aos slides trabalhados em aula e às vídeo-aulas.
Em algum momento entre 27 de junho a 13 de julho foi acrescentada
a ferramenta “Prêmio Escola Transformação” que “tem o objetivo de reconhecer
publicamente as práticas e experiências exitosas das unidades escolares no
processo de melhoria da qualidade do ensino”. No entanto, ao lermos o material
explicativo não encontramos nenhuma relação direta ou indireta com o REANP/MG[13]. Em um exercício de
imaginação, supomos que experiências relacionadas ao Regime mineiro
poderão/deverão concorrer ao Prêmio. Igualmente, é possível imaginar que outros
mecanismos explicativos e orientadores foram empregados e precisam ser
identificados (por exemplo, explicações elaboradas pelas Superintendências
Regionais de Ensino e/ou divulgadas por grupos de WhatsApp e e-mails e/ou
tratadas em reuniões on-line específicas com gestores e professores).
Um possível problema para o sucesso do REANP está no fato de que muitas
políticas e muitos programas exigem dos professores um enorme esforço de
entendimento em abancar palavras de textos e transformá-las em práticas, em
algo que seja viável dentro das complexidades do ambiente da sala de aula.
Frequentemente, esses mesmos professores são confrontados, e ao mesmo tempo,
com outras políticas e/ou demandas diferentes, que podem ser ainda mais
desafiadoras, por tratarem também de questões que envolvem trabalho com
recursos e infraestruturas limitados,
sendo o caso da pandemia e a necessidade de isolamento que impôs. Ademais, “os textos políticos são com frequência
documentos muito mal escritos, os quais criam dificuldades enormes para aqueles
que devem fazer algo com eles” (AVELAR, 2016, p. 7). E ainda mais, mostrando
como as dificuldades podem se sobrepor, somando efeitos perversos sobre o
ensino, cotidianamente durante a pandemia diferentes mídias e pesquisas de
diversas fontes evidenciaram realidades mais deficitárias de acesso às
tecnologias digitais por professores e estudantes de escolas públicas em
relação aos das escolas privadas. Mostram, da mesma forma, as dificuldades de
formação e de condições de trabalho dos docentes em contextos de isolamento
para atuarem com as tecnologias digitais – questão comum em instituições
públicas e privadas, porém, mais acentuada nas primeiras. Não podemos esquecer
que o trabalho docente tornou-se ainda mais domiciliar (pois já o era antes da
pandemia), misturando e confundindo-se com a vida familiar e privada (MENDES; SILVA, no prelo).
Por tudo isso, podemos imaginar as dificuldades relacionadas ao
êxito de algo praticável por professores e gestores a partir das ferramentas do
REANP. Os professores e gestores tiveram pouco tempo na assimilação dos textos dessas
ferramentas, sendo essas apresentadas com problemas de organização
didático-pedagógica no entendimento de suas funções. Em nossas pesquisas, constatamos que as secretarias de educação
enfrentaram desafios ao traçarem estratégias acerca das políticas educacionais
com o intuito da realização do ensino remoto. Muitas secretarias de educação de
estados e municípios adotaram, desde março de 2020, regimes de estudos não presenciais
– uma versão do ERE focada na Educação Básica e, em vários estados e
municípios, com denominações similares[14]
– e, com isso, traçaram estratégias e meios para que o ensino remoto ocorresse
diante das adversidades. Mesmo com os esforços constatados, em uma primeira
sondagem feita em todos os sites das Secretarias de Estado da Educação dos
estados e do Distrito Federal, observamos uma certa dificuldade na organização
e divulgação dos materiais, das estratégias e dos procedimentos sobre o ensino
remoto no período pandêmico. Em vários deles, a disposição dos materiais mais
parece um emaranhado de hiperlinks, publicizados no site no momento que foram produzidos,
não tendo uma lógica de ordenamento pedagógico de acesso[15].
Em outros, o ensino remoto se confunde com noções de ensino híbrido, com
duvidoso lastro teórico e conceitual concernente ao assunto (MENDES; SILVA, no
prelo). Infelizmente, nos materiais encontrados nos sites relacionados ao REANP
mineiro, as mesmas dificuldades de organização para dar sentido didático-pedagógico
ao material foram observadas.
Isso
posto, compreendemos que os caminhos de tradução das políticas e dos programas em
prática é um processo complexo, pois inicialmente eles se configuram em um
texto e devem ser transformados em ações. Esse processo é algo difícil e
desafiador, pois cada local em que o REANP foi e está sendo implementado
apresenta suas particularidades e necessidades, como também há a questão de
interpretação e criatividade por cada um que o utiliza. A escrita de propostas
e políticas para escolas utópicas não pode ser simplesmente interpretada. Ela
passa por um processo completo de tradução, negociação e análise, sendo
colocada (ou não colocada) em prática por ações dos professores e gestores, com
formações diferentes e em contextos diversos (BALL, 2020), que, no caso do
REANP, devem ainda fazer um grande esforço de entendimento sobre o que
realmente está sendo proposto com e nas ferramentas divulgadas e oportunizadas.
Muitas vezes, esses tipos de
propostas ou mudanças de política educacional desconsideram que “os
profissionais que atuam no contexto da prática [escolas, por exemplo] não
enfrentam os textos políticos como leitores ingênuos, eles vêm com suas
histórias, suas experiências, seus valores e seus propósitos” (BOWE et al.,
1992, p. 22). Isso é especialmente importante se considerarmos as dificuldades
estruturais (acesso a máquinas, conexões e assistência técnica minimamente
satisfatórias), econômicas (salários indignos[16]
para a vida cotidiana, sendo impensado a compra de máquinas mais adequadas para
o trabalho pedagógico) e de formação (cursos de formação de professores que não
tratam ou tratam superficialmente do emprego das tecnologias digitais na
educação) que os profissionais da educação passam e/ou convivem quando encaram
o uso de tecnologias digitais nas escolas. Além disso, somando-se às diferenças
existentes – com formas diversas e desequilibradas de acesso e entendimento
técnico das tecnologias digitais – entre professores que atuam em escolas de
cidades de pequeno, médio ou grande porte[17],
evidencia-se que “políticas serão [re]interpretadas diferentemente, uma vez que
histórias, experiências, valores, propósitos e interesses são diversos”. Por
todos esses motivos – com o ensino sendo reestruturado a partir do isolamento
social, de maneira remota – acentua-se ainda mais “que os autores dos textos
políticos não [têm como] controlar os significados de seus textos. Partes podem
ser rejeitadas, selecionadas, ignoradas, deliberadamente mal-entendidas,
réplicas podem ser superficiais etc.” (BOWE et al., 1992, p. 22) quando se
encontram no contexto da prática e com tantas variáveis a interferir no
trabalho docente.
Considerações finais
A pandemia está sendo um
grande contexto de influência, afetando as políticas e os programas de ensino
no Brasil e no mundo. No cenário que se apresentou, muitas mudanças foram
necessárias para que a aprendizagem escolar não ficasse estagnada. O ensino
remoto começou como uma alternativa segura às aulas presenciais. Contudo, esse
começo foi abarcado por muitos desafios e muitas dificuldades por todos que
estavam envolvidos no processo de implementação e funcionamento do REANP.
Podemos perceber que, mesmo diante de ações tomadas pelos governos estaduais e
pelas secretarias de educação, ainda existem vários problemas que persistiram
no ensino remoto ofertado pelas escolas brasileiras. Acrescenta-se ao cenário
das incertezas, o fato de não sabermos por quanto tempo teremos que nos manter
isolados ou se outras endemias ou pandemias dessa natureza nos assolarão
novamente, pois são acontecimentos que acompanham a história humana desde a
Grécia Antiga (SOZINHO, 2021). Considerando as limitações de acesso à Internet
e aos aparelhos digitais – somado ao tempo que alunos e professores ainda terão
que enfrentar atividades essencialmente digitais –, Bonilla et al (2020, p. 12)
já apontavam que “o contexto da pandemia não pode[ria]” ser motivo de se
propor, “de forma desorganizada e imediatista, [...] arranjos para que
gestores, professores e alunos” pudessem empregar “as tecnologias digitais,
como se fossem ações absolutamente normais no cotidiano de todos”. Portanto,
para além da educação ampla e de qualidade dos alunos, temos que analisar as
condições concretas dos professores e estudantes, considerando questões
materiais, emocionais (ansiedade e autoflagelação, por exemplo) e de formação
(CONJUVE et al, 2021).
No contexto da produção do
texto, ressaltamos que o REANP – como um programa de ensino remoto – não se
diferencia em termos metodológicos do ensino presencial (MOREIRA; SHLEMMER,
2020). A diferença está nas formas de adaptação desse ensino presencial que
passa a ser em regime de isolamento e distanciamento social. Embora haja um
distanciamento geográfico, privilegia-se o compartilhamento da aula, ocorrendo
em um tempo síncrono, seguindo princípios do ensino presencial. Porém, podemos
destacar que muitos momentos assíncronos aconteceram. O ensino remoto pautado em
tecnologias digitais, aulas on-line, plataformas e Ambientes Virtuais de
Aprendizagem (AVA) foram as possibilidades acolhidas em muitas políticas e
programas educacionais no período pandêmico e trabalhadas pelas escolas como
mecanismos de ensino e aprendizagem. No entanto, infelizmente essas estratégias
vêm trazendo grandes desafios, pois com o REANP, os professores mineiros tiveram
que se reinventar, aprender e reconstruir suas formas de ensino. Além disso, há
o desafio de formular aulas e conteúdos que possam chegar a todos os alunos de
forma igualitária, sendo o acesso à Internet uma grande barreira para se
superar esse desafio. Como demonstramos ao longo do artigo, o contexto da
produção do texto não acompanha a realidade cotidiana, sem sombra de dúvidas,
mais difícil do que aquela descrita nas ferramentas do REANP.
No contexto da prática, o ensino escolar teve um reinício com
muitos questionamentos e dificuldades. Parte considerável dos docentes não
estava preparada para ter as tecnologias digitais como recurso central do
desenvolvimento de suas aulas. Além disso, muitos alunos não possuíam acesso às
tecnologias necessárias à integração dos mecanismos on-line de ensino em seus
cotidianos. Outros tantos – mais afortunados social e economicamente –,
contanto com aparelhos e Internet adequados, tinham também familiares a
acompanhá-los mais de perto, mesmo que isso tenha acarretado a somatória de
demandas profissionais e domésticas (COUTO
et al, 2020; MENDES; SILVA, no prelo). Antes da pandemia, o foco era conectar escolas com banda
larga no intuito de terem acesso a atividades pedagógicas on-line, sendo o
acompanhamento feito essencialmente pelos docentes. Com a pandemia, essa
necessidade tomou outra dimensão, passando os estudantes a terem a necessidade
de se conectarem para terem acesso ao ensino em espaços extraescolares, com a
necessidade do acompanhamento familiar direcionado ao aumento de sucesso da
aprendizagem (CAVALCANTE et al, 2020).
Ao analisarmos o REANP, à luz do ciclo de políticas, concluímos
que o ensino escolar, antes da pandemia, apresentava dificuldades que se
acentuaram durante a pandemia. No momento da crise sanitária, com o
isolamento/distanciamento social, ficaram gritantes os problemas em relação à
formação de professores, à valorização da profissão docente (estamos falando de
salários minimamente dignos) e condições materiais mais adequadas (estamos
falando de melhores escolas) para o trabalho com as tecnologias digitais na
educação. No pós-pandemia, se as políticas públicas continuarem a dar a mesma
atenção periférica do antes e do durante a pandemia, em uma possível nova crise
sanitária, caminharemos a passos mais largos na direção da barbárie social,
independente se voltarmos a ter um executivo federal ineficaz, incompetente,
despreparado, corrupto e ideologicamente fundamentalista, conservador e
autoritário.
Referencial bibliográfico
ALMEIDA, M. E. B.; VALENTE, J. A. Políticas
de tecnologia na educação brasileira. São Paulo: CIEB, 2016.
AVELAR, M. Entrevista com Stephen J.
Ball. Education
policy analysis archives, v. 4, n. 4, p. 1-18, 2016. DOI: http://dx.doi.org/10.14507/epaa.24.2368.
BALL, S. Educação Global S. A.:
novas redes de políticas e o imaginário neoliberal. Ponta
Grossa: UEPG, 2020.
BALL, S. J.; BOWE, R. Subject departments and the ‘implementation’ of
National Curriculum policy: an overview of the issues. Journal of Curriculum
Studies, v. 24, n. 2, p. 97-115, 1992. DOI: https://doi.org/10.1080/0022027920240201.
BALL, S. J. Educational reform: a critical and post-structural
approach. Buckingham:
Open University Press, 1994.
BONILLA, H. S.; PRETTO, N. L. SENA,
I. P. F. S. Educação em tempos de pandemia: reflexões sobre as
implicações do isolamento físico imposto pela COVID-19. Edição dos autores.
Salvador, 2020. Disponível em: https://blog.ufba.br/gec/files/2020/05/GEC_livro_final_imprensa.pdf.
Acesso em: 28. mar. 2021.
BOWE, R.; BALL, S. J.; GOLD, A. Reforming education and changing
schools. London:
Routledge, 1992.
BRASIL. MEC. Conselho Nacional de
Educação. Parecer CNE/CP nº 05/2020: reorganização do calendário escolar
em razão da pandemia da COVID-19. Brasília: 28 de abr. 2020. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&alias=14511-pcp005-20&category_slud=marco-2020-pdf&Itemid=30192.
Acesso em: 09 jul. 2021.
BRASIL. Presidência da
República. Lei nº 14.040, de 18 de agosto de 2020: estabelece normas
educacionais excepcionais a serem adotadas durante o estado de calamidade
pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020.
Brasília: 18 ago. 2020a. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2020/Lei/L14040.htm.
Acesso em: 15 mar. 2021.
BRASIL. Conselho Nacional de
Educação. Nota de esclarecimento. Brasília: 18 de mar. 2020b. Disponível
em: http://consed.org.br/media/download/5e78b3190caee.pdf.
Acesso em: 15 jul. 2021.
BRASIL. INEP. Pesquisa resposta
educacional à pandemia de COVID-19. Brasília: INEP, 2021. Disponível em: https://www.gov.br/inep/pt-br/areas-de-atuacao/pesquisas-estatisticas-e-indicadores/censo-escolar/pesquisas-suplementares/pesquisa-covid-19.
Acesso em: 09 jul. 2021.
CASTIONI, R.; MELO, A. A. S.;
NASCIMENTO, P. M. Universidades federais na pandemia da Covid-19. Ensaio,
v. 29, n. 111, abr./jun. 2021. DOI: https://doi.org/10.1590/s0104-40362021002903108.
CAVALCANTE, A. L. L.; DOURADO, A.
C. S.; MARTINS, A. Educar em tempos de incertezas: a implementação do ensino
remoto na rede municipal de Floriano-Piauí. Revista Dialogia, n. 36, p.
73-85, set./dez. 2020. DOI: https://doi.org/10.5585/dialogia.n36.18619.
CONJUVE e parceiros. Juventudes
e a Pandemia do Coronavírus. Brasília, 2021. Disponível em:
https://mk0atlasdasjuve5w21n.kinstacdn.com/wpcontent/uploads/2021/06/JuventudesEPandemia2_Relatorio_Nacional_20210607.pdf.
Acesso em: 13 jul. 2021.
COUTO, E. S.; COUTO, E. S.; CRUZ,
I. M. P. #Fiqueemcasa: educação na pandemia da covid-19. Interfaces
Científicas, v. 8, n. 3, p. 200-217, 2020. DOI: https://doi.org/10.17564/2316-3828.2020v8n3p200-217.
DREYFUS, H. L.; RABINOW, P. Michel
Foucault: uma trajetória filosófica. Rio de Janeiro: Forense Universitária,
1995.
ELLSWORTH, E. Modo de endereçamento.
In: SILVA, T. T. (Org.). Nunca
fomos humanos.
Belo Horizonte: Autêntica, 2001.
HODGES, C.; MOORE, S. LOCKEE, B. TRUST, T. BOND, A.
The Difference Between Emergency Remote Teaching and Online Learning. Educause Review, 2020. Disponível
em: https://er.educause.edu/articles/2020/3/the-difference-between-emergency-remote-teaching-and-online-learning#fn3.
Acesso em: 15 jul. 2020.
LIMA, L. F.; SOUZA, B. S.; LUCE, M.
B. A abordagem do ciclo de políticas nos programas de pós-graduação
brasileiros: um mapa das teses e dissertações. Revista de Estudios Teóricos y Epistemológicos en Política Educativa,
v. 3, p. 1-29, 2018. DOI: https://doi.org/10.5212/retepe.v.3.008.
MAINARDES, J. Abordagem do ciclo de políticas: uma contribuição para a análise
de políticas educacionais. Revista
Educação e Sociedade, v. 27, n. 94, p. 47-69, jan./abr. 2006. DOI: https://doi.org/10.1590/S0101-73302006000100003.
MAINARDES, J.; MARCONDES, M. I. Entrevista com Stephen J. Ball: um diálogo
sobre justiça social, pesquisa e política educacional. Educação & Sociedade, v. 30, n. 106, p. 303-318, jan./abr.
2009. DOI: https://doi.org/10.1590/S0101-73302009000100015.
MAINARDES, J.; GANDIN, L. A. A
Abordagem do ciclo de políticas como epistemetodologia. In: TELLO, C.;
ALMEIDA, M. L. P. (Orgs.). Estudos epistemológicos no campo da pesquisa em
política educacional. Campinas: Mercado de Letras, 2013.
MENDES, C. L.; SILVA, R. A panaceia
do ensino híbrido: o público, o privado e o futuro da educação. Currículo
sem Fronteiras, no prelo.
MINAS
GERAIS. Secretaria de Estado de Educação. Resolução see nº 4310/2020: dispõe
sobre normas para a oferta de regime especial de atividades não presenciais. Cidade
Administrativa: 17 abr. 2020. Disponível em: https://www2.educacao.mg.gov.br/images/documentos/Resolucao%20SEE_N__4310.pdf.
Acesso em: 13mar. 2021.
MOREIRA,
J. A; SCHLEMMER, E. Por um novo conceito e paradigma de educação digital
online. Revista UFG, v. 20, 2020. DOI: https://www.revistas.ufg.br/revistaufg/article/view/63438.
OLIVEIRA,
B. R.; OLIVEIRA, A. C. P.; JORGE, G. M. S.; COELHO, J. I. F. Implementação da
educação remota em tempos de pandemia. RIAEE, v. 16, n.1, p. 84-106,
jan./mar. 2021. DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v16i1.13928.
PERRENOUD,
P. Pedagogia diferenciada. Porto Alegre: Artmed, 2000.
RONDINI,
C. A.; PEDRO, K. M.; DUARTE, C. S. Pandemia da covid-19 e o ensino remoto
emergencial. Interfaces Científicas, v. 10, n. 1, p. 41-57, 2020. DOI: https://doi.org/10.17564/2316-3828.2020v10n1p41-57.
ROSA, S. S. Uma introdução às
ideias e às contribuições de Stephen J. Ball para o tema da implementação de
políticas educacionais. Revista de Estudios Teóricos y Epistemológicos en
Política Educativa, v. 4, p. 1-17, 2019. DOI: https://doi.org/10.5212/retepe.v.4.004.
ROSE, N. Inventing our selves. London: Cambridge, 1996.
SAMPAIO, R. M. Práticas de ensino e
letramentos em tempos de pandemia da COVID-19. Research, Society and Development, v. 9, n. 7, 2020. DOI: https://doi.org/10.33448/rsd-v9i7.4430.
SANTANA,
C. L.; SALES, K. M. Aula em casa: educação, tecnologias digitais e pandemia
COVID-19. Revista Interfaces Científicas, v. 10, n. 1, p. 75-92, 2020.
DOI: https://doi.org/10.17564/2316-3828.2020v10n1p75-92.
SANTOS, A. P. Abordagem do ciclo de
políticas e suas contribuições para análise da política de avaliação em larga
escala. Meta: Avaliação, v. 6, n.
18, p. 263-280, set./dez. 2014. DOI: http://dx.doi.org/10.22347/2175-2753v6i18.391.
SOZINHO, C. As pandemias
e endemias na história da humanidade: balanço histográfico. KULONGESA, v.
3, n. 1, p. 25-32, 2021. Disponível em: https://kulongesa.ispls.ao/index.php/kulongesa-tes/article/view/237.
Acesso em: 17 jul. 2021.
STREMEL, S. MAINARDES,
J. A constituição do campo da política educacional no brasil como objeto de
estudo. Revista Educação e cultura contemporânea, v. 16, n. 46, p.
31-46, 2019. DOI: HTTP://DX.DOI.ORG/10.5935/2238-1279.20190097.
UNESCO. Supporting learning recoveryone year into
COVID-19: the global education coalition in action. Paris: UNESCO,
2021. Disponível em: https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000376061.
Acesso em: 20 maio 2021.
Recebido
em: 22/07/21
Aprovado
em: 26/08/21
[1] Doutorado
em Educação pela UFRGS. Professor Associado do Departamento de Educação da
Universidade Federal de Lavras, atuando como pesquisador da área de Educação,
Neurociência e Tecnologia e professor do Mestrado em Educação Profissional da
UFLA. Coordenador do Grupo de Estudo, Pesquisa e Extensão de Educação e
Neurociência (ENE). E-mail: claudio.mendes@ufla.br
ORCID: http://orcid.org/0000-0001-6114-0566
[2] Aluna do Mestrado do Programa de
Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Lavras
(UFLA)-Lavras-MG-Brasil . E-mail: tiellealves@yahoo.com.br.
ORCID: http://orcid.org/0000-0002-7551-7077
[3] A política educacional no Brasil, como um campo acadêmico de estudo, vem
se estruturando “desde o final da década de 1960, com a criação de associações
científicas como a ANPAE (1961), com a utilização mais frequente do termo
‘política educacional’ em publicações e em documentos oficiais e com a
implantação da Pós-Graduação (1965) e do primeiro mestrado em Educação
(PUC-Rio, 1966)” (STREMEL; MAINARDES, 2019, p. 36), tratando dos mais diversos
temas nas áreas de administração da educação, políticas públicas, educação
comparada e algumas outras. De maneira um pouco marginal a esse movimento e de
modo mais recente, podemos considerar que as análises dos programas e das
políticas educacionais sobre o emprego das tecnologias digitais começaram na
década de 1980, no mesmo momento que as próprias tecnologias digitais começaram
a ser propostas para o emprego educacional e, mais especificamente, escolar
(ALMEIDA; VALENTE, 2016).
[4] Pelo que conseguimos rastrear, o termo Ensino Remoto Emergencial
(emergency remote teaching – ERT – em inglês) foi empregado pela primeira vez no
início de 2020 em grupos de mídias sociais de professores que trabalham com
educação e tecnologia em universidades norte-americanas, caracterizando “uma
mudança temporária de ensino [presencial, EAD, on-line ou híbrido] para um modo
de ensino alternativo devido a circunstâncias de crise. Envolve o uso de
soluções de ensino totalmente remotas que, de outra forma, seriam ministradas
presencialmente ou como cursos combinados ou híbridos e que retornariam a esse
formato assim que a crise ou emergência diminuísse. O objetivo principal,
nessas circunstâncias, não é recriar um ecossistema educacional robusto, mas,
sim, fornecer acesso temporário à instrução e aos suportes instrucionais de uma
maneira que seja rápida de configurar e esteja disponível de forma confiável
durante uma emergência ou crise” (HODGES et al, 2020, s./p.).
[5] Uma dessas dificuldades constatadas foi sobre as elaborações dos textos
dos programas e propostas do ensino remoto. Observamos – em pesquisas nos sites
dos estados e do Distrito Federal (ver notas de rodapé nº 8 e 9) – que ao longo
do ano de 2020 foi constante a reescrita de normas, decretos e propostas
relacionados ao ensino remoto. Como já dito, tudo era muito recente, exigindo
posicionamentos imediatos que, muitas vezes, precisaram ser reformulados, tornados
sem efeito ou detalhados com mais cuidado.
[6] Para saber mais consulte
https://www.who.int/es/emergencies/diseases/novel-coronavirus-2019?adgroupsurvey=%7badgroupsurvey%7d&gclid=EAIaIQobChMImKO-mLXo8QIVD4bICh2pzQrTEAAYAiAAEgLucvD_BwE.
[7] Segundo Oliveira et al (2021, p. 94), ao analisarem o funcionamento do
REANP, argumentam que “para os estudantes que não possuem acesso à Internet” as
escolas deverão “assegurar que o material impresso seja disponibilizado ao
estudante. Com o apoio das 47 Superintendências Regionais de Ensino [de Minas
Gerais], caberá às escolas identificar como o material chegará a todos os
estudantes”.
[8] Para saber mais consulte https://estudeemcasa.educacao.mg.gov.br/inicio.
[9] Informações no
site https://estudeemcasa.educacao.mg.gov.br/inicio.
Acesso em: 27 jun. 2021.
[10] Com o objetivo de preparar os professores no emprego das ferramentas propostas, a
SEE/MG ofertou cursos sobre a
utilização das tecnologias digitais no
ensino escolar. Para
saber mais consulte
https://escoladeformacao.educacao.mg.gov.br/index.php/inscricoes-abertas/341-curso-google-for-education-recursos-e-possibilidades-t2.
Acesso em: 28 jun. 2021.
[11] Informações em
https://estudeemcasa.educacao.mg.gov.br/fortalecimento-das-aprendizagens.
Acesso em: 27 jun. 2021.
[12] Informações em https://estudeemcasa.educacao.mg.gov.br/projeto-vamos-aprender
e https://vamosaprender.tv.br/sobre/.
Acessos
em: 29 jun. 2021.
[13] Para saber mais consulte https://estudeemcasa.educacao.mg.gov.br/premio-escola-transformacao. Acesso em: 13 jul. 2021.
[14] O termo Regime Especial de Atividades Não Presenciais (REANP) não consta
em nenhum documento do CNE ou do MEC. Em uma Nota de Esclarecimento, de 18 de
março de 2020, o CNE autoriza “a realização de atividades a distância” em toda
a Educação Básica, incluindo Educação profissional, EJA e Educação Especial
(BRASIL, 2020b). Na Resolução CNE/CP nº 5/2020 consta “regimes especiais
de ensino que compreendam atividades não presenciais mediadas ou não por
tecnologias digitais de informação e comunicação” (BRASIL, 2020, grifos
nossos). Em uma página do CONSED (https://consed.info/ensinoremoto/),
atualizada em 13 de julho de 2021, e nos respectivos sites das secretarias, consta
que os estados de Alagoas (Regime Especial de Atividades Escolares Não
Presenciais – REAENP), do Ceará (Regime Especial não Presencial), do Espírito
Santo (Atividades Pedagógicas Não Presenciais), de Goiás (Regime Especial de
Aulas não Presenciais – REANP), de Minas Gerais (Regime Especial de Atividades
Não Presenciais – REANP), da Paraíba (Regime Especial de Ensino) empregam termos
similares, com características de organização relacionadas com atividades
on-line, televisivas, impressas e, algumas vezes, com algum tipo de referência
a noções diversas de hibridismo no ensino.
[15] Esse levantamento foi realizado
entre 22 de março a 1º de abril, nos seguintes endereços: Acre (https://educ.see.ac.gov.br/pagina/see-principal;
Alagoas (http://www.educacao.al.gov.br/);
Amapá (https://seed.portal.ap.gov.br/);
Amazonas (http://www.seduc.am.gov.br/);
Bahia http://www.educacao.ba.gov.br/);
Ceará (https://www.seduc.ce.gov.br/);
Distrito Federal (http://www.educacao.df.gov.br/); Espírito
Santo (https://sedu.es.gov.br);
Goiás (https://site.educacao.go.gov.br/);
Maranhão (https://www.educacao.ma.gov.br/?site=1);
Mato Grosso (http://www.seduc.mt.gov.br/);
Mato Grosso do Sul (https://www.sed.ms.gov.br/); Minas Gerais (https://www2.educacao.mg.gov.br/);
Pará (http://www.seduc.pa.gov.br/);
Paraíba (https://paraiba.pb.gov.br/diretas/secretaria-da-educacao-e-da-ciencia-e-tecnologia); Paraná (http://www.educacao.pr.gov.br/); Pernambuco
(http://www.educacao.pe.gov.br/portal/);
Piauí (https://www.seduc.pi.gov.br/);
Rio de Janeiro (https://www.seeduc.rj.gov.br/); Rio Grande do Norte (http://www.educacao.rn.gov.br/); Rio
Grande do Sul (https://educacao.rs.gov.br/inicial);
Rondônia (http://www.rondonia.ro.gov.br/seduc/); Roraima (http://www.educacao.rr.gov.br/);
Santa Catarina (https://www.sed.sc.gov.br/); São Paulo (https://www.educacao.sp.gov.br/);
Sergipe (https://www.seed.se.gov.br/oficial.asp);
Tocantins (https://seduc.to.gov.br/).
[16] Em Minas Gerais, com base em dados de 2020, “o salário de
Professor da Educação Básica (PEB) varia entre R$ 1.455,30 e R$ 2.135,64, para
jornadas de trabalho de 24 horas. A remuneração média do Diretor de Escola é R$
6.741,48. O Especialista em Educação Básica (EEB), responsável pelo trabalho de
orientação, implementação e avaliação do processo de ensino e aprendizagem nas
escolas, tem remuneração média de R$ 3.481,20” (OLIVEIRA
et al, 2021, p. 91).
[17] Minas Gerais tem uma população estimada de 21 milhões de pessoas, sendo “o
segundo estado mais populoso, [com]
o maior número de cidades [...]”, constituindo-se em “uma
das regiões mais heterogêneas do país”, coexistindo “regiões
dinâmicas, modernas e com elevados indicadores socioeconômicos e localidades
empobrecidas e pouco desenvolvidas”. O Índice de Desenvolvimento Humano
Municipal (IDH-M) das “regiões
sudoeste, sul, sudeste e na Região Metropolitana de Belo Horizonte”
– esta última, onde basicamente são pensadas as
políticas públicas para todo o estado – são os mais elevados. “Por
outro lado, as mesorregiões localizadas nas regiões norte, noroeste e nordeste
são as menos desenvolvidas e, portanto, as mais desiguais. Ainda que não respondam por um número
expressivo de habitantes, metade da população dessas regiões vive em situação
de pobreza e extrema pobreza” (OLIVEIRA et al, 2021, p. 89).